segunda-feira, 27 de abril de 2020

Obrigado Ricardo

Pernambuco e o Brasil começam esta semana (hoje é 27/04/20) mais pobres empresarial e culturalmente falando. Morreu Ricardo Brennand. Com 92 anos de idade não resistiu ao violento vírus da Covid-19. É certo que, sendo portador de comorbidades sérias, já teria menos resistência. Lamentável forma de partir, mas crível como em todo falecimento. Parte o Homem e fica seu imenso legado: nas atividades industriais, comerciais, sociais e sobremodo no mundo da Cultura. Em 26 de Julho de 2011, este blogueiro após uma das visitas ao Instituto Ricardo Brennand, por ele arquitetado e construído, escreveu um post intitulado Arte, a Essência da Vida cujos insertos, por oportuno, são a seguir destacados:
A arte é a essência da vida... Quanto mais amadureço, mais me conscientizo disso. Um engenheiro, um arquiteto, a costureira suburbana, o músico e o ator, o grafiteiro, a cozinheira, o jardineiro, o engraxate, o pintor e o escultor, entre muitos outros, são todos artistas. Pensando bem, todo ser humano, afinal de contas e numa instancia qualquer da vida, é um artista. No dia a dia estamos habituados a ver os artistas sob uma ótica muito restrita.
 
Mas, é artista também quem lida com a arte de outros e as cultiva com devoção e competência. Explico: neste fim de semana (ontem, 24.07.11) fui ver a exposição temporária da obra de Michelangelo (Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simon 1475-1564), no Castelo de São João da Várzea – Instituto Ricardo Brennand, no Recife.
Causou-me impacto dar de cara, logo na chegada, com uma réplica autenticada da famosa escultura de David, do mestre italiano, aquela cujo original está em Florença e que algumas vezes, por sorte, pude admirar. Aquilo foi incrível, em face do cenário no qual ela foi inserida. Depois daquele primeiro momento impactante, adentrei à nova Galeria do Instituto e, aos poucos, mergulhei num mundo de esculturas clássicas, nem sempre de Michelangelo, minhas velhas conhecidas e por mim visitadas outrora. Com uma feliz diferença de que, agora, elas vieram “visitar-me”. Sim, claro, elas estão com todo esplendor e dispostas com rigorosa curadoria a poucos quilômetros do meu endereço.
Jovens da Periferia observando algo diferente da vida
Quem pensaria numa coisa dessas, no passado, aqui do Recife? É preciso ser artista como Ricardo Brennand – que, sem cinzel ou pincel – pratica a finíssima arte de colecionar obras de arte. Despido de qualquer sintoma egoísta, esse pernambucano transfigurado num mecenas dos tempos modernos, presenteou Pernambuco e o Brasil com uma das mais importantes entidades culturais deste país. Atravessar os portões do Instituto e percorrer a alameda de acesso ao complexo cultural é possível sentir uma gostosa sensação de estar viajando rumo à Idade Média ou a uma praça renascentista da Velha Europa. Nas linhas arquitetônicas ou no entorno de paisagens bucólicas, nas obras de arte espalhadas a céu aberto ou indoor, tudo que se respira é arte. Como não entender que tudo aquilo é a essência do viver de um cidadão que não guardou apenas para si o sabor de colecionador, mas, socializou seu acervo num projeto monumental, raro e invejável.
Naquela visita, do já distante 2011, pude observar pessoas visivelmente mais simples, certamente, moradores da pobre periferia recifense, surpresas com o que viam e atentas às explicações da jovem guia que, didática e pacientemente, descrevia cada obra exposta e a própria vida do escultor italiano, causando certa admiração dos espectadores. Ricardo Brennand repete, em Pernambuco, o que o, também, mecenas, Mauricio de Nassau, operou no Século 16.

Tive o prazer e a honra de ser convidado para a inauguração do Instituto, em 2002, que se revestiu de grande acontecimento sociocultural na cidade, contando, lembro bem, com a presença do Príncipe Frederik, herdeiro da Dinamarca, trazendo as obras do pintor Albert Eckout, do acervo do Museu nacional da Dinamarca, para a especial exposição inaugural do Museu. Eckout viveu em Pernambuco, na época do domínio holandês, trazido por Mauricio de Nassau. Pintou monumentais obras retratando o povo e a vegetação da terra.  
Agora, nosso Ricardo partiu fisicamente, mas sua alma culta está impregnada nas paredes daquele Castelo que construiu nas franjas do Recife.

Obrigado Ricardo Brennand!

Quer saber mais sobre o Instituto Ricardo Brennand? Clique em www.institutoricardobrennand.org.br

NOTA: As fotos da postagem são do blogueiro.

sábado, 25 de abril de 2020

Mostrando sua Cara

O deprimente espetáculo politico protagonizado, ontem (24/04/2020), pelos “ilustres” ex-Ministro de Estado da Justiça e Segurança, Sergio Moro, e o Presidente da República, Jair Bolsonaro, foi o retrato vivo do que é a República Federativa do Brasil. O país arredondou, para a Comunidade Internacional, a sua verdadeira cara, matando de inveja muitas republiquetas espalhadas pelo planeta.

Com imensa perplexidade o povo brasileiro viu – a cores e ao vivo – um deprimente episódio da maior “lavação de roupas sujas” da história recente do país. Foram momentos de demonstrações impiedosas de inflados egos dos dois personagens que, acintosamente, esqueceram a Nação e o povo com os quais se comprometeram em garantir lealdade, segurança e defesa. Desenvolveram longas conversas para, no final, anunciaram suas simples decisões. Pelo que me consta, nomear e demitir um auxiliar, independendo do nível que atue na administração do Estado, não deve se constituir num motivo capaz de abalar as estruturas politicas. Mas, abalou. Esta é a verdade. E, nesse caso específico, deveras  inoportuna diante da crise de saúde pública que sufoca os brasileiros. A pandemia do Covid-19 é real e tangível. Deprimente para quem se diz patriota, muito embora haja sido uma lição de Democracia a mais. Aprendizado doloroso tem sido este nosso. Mas, que seja valorizada. Espero que seja página virada. 
O episódio de ontem, contudo, poderia não ser surpreendente, haja vista para uma simples espiada num retrovisor, quando se visualiza, nitidamente, uma contínua série de trapalhadas politicas, protagonizadas por falsos líderes eleitos e inabilitados para os cargos. Diga-se, inclusive, que em todas as dimensões geopolíticas. Aos trancos e barrancos, tivemos, na Presidência da República, um mal sucedido caçador de marajás, um sindicalista metalúrgico alumbrado com o ritual e as etiquetas do cargo, além de ser louco por dinheiro e, para completar, uma falsa intelectual, despreparada para presidir até mesmo um condomínio residencial. Resultado: dois impedidos das funções e um condenado às grades por roubos qualificados aos cofres públicos. "Belos" exemplos de mandatários!
Mas, como se fosse pouco e fruto  indiscutível das inconsequências gestões anteriores, um novo “salvador da pátria” desponta no perplexo horizonte nacional e ganha embalagem para subir a rampa. Está lá! Mas, ao contrário do alumbrado, não está sabendo lidar com os rituais e etiquetas exigidas pelo cargo e não cansa de aprontar descaminhos políticos, para desespero dos seus eleitores e auxiliares. Confesso que, sem outra opção, votei nele. Agradecido, inclusive pelo grande bem que prestou ao país ao banir os petistas desastrados das posições chaves da República. Ainda alimento esperanças e torço para que se aprume. É um desafio colossal. Precisamos de seriedade e ele se diz sério. Terá tempo para provar. Aguardemos.    
Abre os olhos Brasil! Tenta mostrar uma cara mais digna.

Nota: A ilustração foi obtida no Google Imagens e remete à famosa composição musical de Cazuza

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Dando marcha à Ré

As coisas estariam bem mais tranquilas em meio a esta crise pandêmica, no seu capítulo brasileiro, se o ambiente político nacional não sofresse tantos choques convulsivos como vem ocorrendo. Foi o tema central da minha última postagem, na qual e noutras palavras o que tentei passar foi a ideia de que “unidos venceremos”. 
A convulsão de hoje (23/04/2020) abrindo a possibilidade de afastamento do Ministro Sérgio Moro era tudo que não se esperava ou desejava. O homem símbolo da limpeza moral da política nacional e indiscutível sustentáculo do Governo Bolsonaro ameaçando bater retirada da Esplanada dos Ministérios, por discordar da interferência presidencial, que ameaça demitir o Diretor-Geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, é tudo que o país não esperava. Valeixo é sabido ser braço direito do Ministro. Indiscutivelmente, uma lamentável marcha à ré na rota de moralização política do país e principal bandeira de campanha.
Desencontro Indesejado  
Ora, meu Deus, o Ministro Moro é um patrimônio moral consagrado internacionalmente. Honra o país e seguramente é o símbolo maior da reserva moral da República. Lembre-se disso Bolsonaro! Aliás, e a propósito, carta branca é Carta Branca. Esquecê-la, agora, é dar violento marcha à ré. Se apresse e engate uma marcha de força para frente.
Ainda na ressaca do tremor de ontem, quando vi, com imensa surpresa, a aproximação inesperada de Bolsonaro com os chamados partidos do Centrão sob uma alegação visível de garimpar apoio político no Congresso foi danado. Mudou de ideia, Presidente? Vai querer um Governo de Coalizão?

Para completar, e num lance mais ousado, vi o Presidente anunciar a possibilidade de “esquartejamento” do Ministério da Economia, tão bem estruturado neste Governo. Recriar o Ministério do Trabalho e confiá-lo à mesma corja sindicalista que tantos prejuízos causou à nação na era fatídica do PT é, no mínimo, vergonhoso. Nessa esteira de convulsão política  vi, pasmo também, a promessa governamental de lotear cargos menores, diga-se que não menos importantes e, sim, estratégicos, para esses partidos convidados a contribuir. Ibama e Banco do Nordeste, entre esses. É lasca!
Sinceramente, Senhor Presidente, sou seu defensor, mas, não sou cego. Vá com cuidado com essas relações perigosas que estão lhe iludindo. Para agradar a quem? O Brasil inteiro espera que o Senhor cumpra sua palavra. Sobretudo agora com a pandemia correndo solta e livre. Pobre Brasil.

NOTA: Foto obtida no Google Imagens

sábado, 18 de abril de 2020

Lições da Pandemia

A aguda crise da Pandemia que assola o Planeta tem sido tratada de modos distintos de país a país e em diferentes regiões. O Coronavírus ou Covid-19, como queira chamar, não pede licença para entrar e não respeita fronteiras, raças ou culturas. Praticamente, nivelou por baixo toda a humanidade. Sem dó e sem limite. Contudo, a depender de cada localidade e respectivo ambiente sócio-político, a atual administração da saúde pública tem sido o desafio maior de todo e qualquer governante.  
Antes de redigir este post tive a curiosidade de procurar ver notícias veiculadas por mídias de outros países, tentando avaliar o clima reinante no meio do mundo. Não pretendo fazer qualquer referencia pontual. Além do mais afirmar que não fiz avaliações profundas, até por não ser especialista no assunto. Contudo, pude perceber climas de união entre as várias classes sociais, por pais, no sentido de tornar a situação mais amena e definir caminhos para atravessar a crise ao modo de proteger suas sociedades. Tem custado muito caro e muitos não sabem como segurar suas contas. Faltam recursos infra e dinheiro, naturalmente. Mas, na maioria há um consenso que trata da salvação.
Ao contrário disto e motivo das reflexões que faço agora, voltei-me a analisar a situação vexatória que se desenvolve aqui no Brasil. Parece coisa de loucos, numa ocasião tão critica como a que vivemos quando o que mais importa é a saúde pública e as ações que levem ao conforto e segurança da população. Mas não! Não é nada disto que vemos entre nós brasileiros. A crise caiu no insensato precipício da politicagem barata que tomou conta do país nesses últimos anos e infectou todas as correntes político-partidárias, que pugnam por negar um acordo nacional pela luta contra um inimigo comum a todos e, o pior de tudo, desconhecido. No recesso da quarentena e com o espirito intranquilo vejo com perplexidade o violento processo de destruição do já esgarçado tecido social nacional. É inconcebível a falta de consenso politico neste país. O povo não tem a menor importância nas cabeças dos lideres nacionais. Nada republicano. Destaque-se, aliás, ser um conceito pouco entendido pela maioria. Chega ser assustador e inverossímil. A Classe política vem-se portando irresponsavelmente ao travar uma luta titânica com visíveis traços pela busca de resultados favoráveis nos próximos pleitos eleitorais. Até aqueles mais distantes. Ou seja, estão se valendo da fragilidade nacional imposta pelo Coranavírus para armar palanques eleitorais e alcançarem  ou manter o poder. Que vergonha!    

Deus é brasileiro?

Bom, para que ninguém venha dizer que sou cego, lembro e admito que por mais intempestivo que seja o nosso Presidente, Bolsonaro, não se admite que haja uma contenda tão estúpida e vexatória como a que vivemos. E o povo, onde fica?
Tudo isto, aliás, fruto do despreparo social e político que reina neste país. Faltam educação e ética coletiva, assim como orientação política de uma gente que, desgraçadamente, vota nos candidatos errados ou naqueles que paguem mais pelo voto que promete depositar na urna eleitoral.
Uma crise como a atual, relativamente inédita pela natureza que imprime, joga luzes nesses aspectos dolorosos que abate uma Nação com tantas potencialidades, apesar da sua dimensão continental e de diferenças abissais.
A verdade que temos hoje é que, embora muitos neguem, vamos sair dessa histórica pandemia com formidáveis lições para serem lembradas no futuro. Resta saber, destarte, se nossas lideranças vão ter tempo para dar um BASTA aos vergonhosos embates, anotarem direitinho onde e quais erros cometeram, desenhando em seguida uma rota mais digna para o Brasil. É um desafio imperativo.
Ouço dizer popularmente que Deus é brasileiro... Assim sendo, peço que Ele nos proteja.      

NOTA: Charge de Guicervera, obtida no Google Imagens.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Dendicasa

O mais curioso de quem está nessa quarentena que vivemos é que todo dia tem cara de fim-de-semana. Quando não é sábado é domingo. Perdi a noção. A exceção de quem é necessário e está na vertical. Eu, como não sou, fico dendicasa. Mas, está sendo dose... Preciso de estomago e fígado aptos. Não posso ir ao clube caminhar, nem à academia, nem ao supermercado ou padaria. E nem na casa do Zôto! Acordo tarde e durmo tarde, também. Lavo as mãos. Fico caçando o que fazer... derna do mês passado. Dendicasa. Tendeu? É da cama pro sofá, lavo as mãos, daí pra mesa, depois pra cozinha, onde me aventuro cozinhar e lavar. Ah! fico olhando embasbacado a maravilha de como a máquina gira bonitin e lava os panos. Nunca havia parado e notado. Lavo as mãos e volto pro sofá, leio o jornal e arrepio os poucos cabelos que restam. Lavo as mãos e corro pro’scritório que está em reforma. Logo agora!Fico desesperado. Ah! vez em quando, vejo-me obrigado a uma passadinha no quartinho (ninguém é tapado!). Aliviado, lavo as mãos.
Perambulando dendicasa, chego à janela, contemplo o horizonte por trás dos zôtos prédios e observo a rua deserta. E sem buzinas. Vejo pássaros! Eles são lindos e estão fazendo a festa. Vejo, também, motos e motoqueiros... Ah, esses são muitos! Livres e soltos nas ruas e avenidas carregam caixas de cores variadas. Cheias de comidas. Olho de volta pra dendicasa, arrisco uma arrodeada sorrateira no carrinho de bebidas. Rendido à tentação, lavo as mãos, meto gelo num copo e cubro com doisdedo de Whisky. Viro logo um primeiro gole enquanto o gelo não derrete e, prazerosamente, começo a projetar um almoço. Lavo as mãos e volto prosofá, ligo a TV, mas desligo depressa porque  dá a impressão de ver jorrar sangue pelas laterais do screen. Pego o celular limpo com Álcool 70º- INPM e acesso o Zap. Choro e dou boas gaitadas, alternadamente. O que dá pra chorar está dando pra rir, também. Lavo as mãos. Pego o livro e volto a ler. Faço um intervalo, lavo as mãos, e pego a faixa cinza de Pilates pra fazer alongamentos. No meio dos exercícios o celular, ainda limpo, chama. É um facetime! Passo a exercer o papel de vovô conversando, com voz de vovô babão. Essa voz funciona tanto para longe, quanto para muito longe. Lavo as mãos e tomo outro gole do whisky, que já virou água. Ligo o som, escuto Bocelli, meu favorito, lavo as mãos e volto a ler o livro... Faço anotações pensando em você que está lendo estas bobeiras de um "prisioneiro" inocente.
Meu Deus do céu, qué-qu’eu faço mais, dendicasa? Pensei em tirar férias. A ideia foi luminosa, até descobrir que só resta uma opção de outro dendicasa, lá na serra. Peraí, quero minha vidinha antiga de volta. Será que será igual? Estou me dando conta que era feliz e nem sabia.  
a playliMeu Deus do
Nota: Charge de Renato colhida no Google imagens.
 
 

 

 

quinta-feira, 9 de abril de 2020

Todo Mal traz um Bem

A velha sabedoria popular sempre alerta que não existe mal que não seja seguido de um bem. Minha finada mãe sempre fazia uso desse principio nos momentos em que algum estresse rolava. Nestas horas de Coronaquarentena tenho pensado muito assim. O retiro social que estamos sendo submetido, inexoravelmente, induz a muitas reflexões. Agreguem-se a isto as oportunidades de ricas trocas de opiniões – excetuando-se as de caráter politiqueiros, claro – que, de modo indelével, contribuem na travessia deste deserto pandêmico, graças às modernas tecnologias (Celular, WhatsApp, correio eletrônico, etc.) que facilitam à situação.
Nesta viagem dentro de casa, tenho experimentado bons papos com pessoas de cabeças feitas e que por sorte passam a contribuir para esta postagem de hoje.

É surpreendente, por exemplo, observar que jovens dos tempos de agora possam exercitar jornadas de retiros espirituais movidos por uma filosofia budista e que tomam dias a fio meditando sobre a vida, a natureza e o destino das nações. Eles existem. E conheço um. J. Morandi Jr., de nacionalidade argentina, faz isso e me garantiu que passar pela atual quarentena é relativamente fácil, não obstante o motivo assustador. “O mundo precisa parar para pensar!” Foi, mais ou menos, assim que me asseverou, numa conversa ontem (08.04.20) à noite. É um jovem, que vi crescer e se tornar adulto, capaz de se enclausurar num mosteiro e passar entre dez e trinta dias sem proferir uma só palavra e somente pensando. A ordem é meditar. Uma esperança para o futuro.
O Retrato do Medo
Noutro momento, numa conversa com amigo economista experiente, vi reforçar a tese da sabedoria popular já referida. J. Moraes Falcão lembrou que “o momento atual é de sacrifício e morte, mas, é também de ressureição”.  Ele quis se referir que a sociedade moderna morre e logo ressuscita. Uma correlação subjacente ao momento da semana santa. Óbvio. E, corroborando com a ideia do Bem porvir, acrescentou: “a Covid-19  trouxe a reaproximação familiar e revelou a insignificância da vida virtual. Aliou maridos e esposas mostrando que podiam ser solidários nos afazeres domésticos. Mostrou que havia vida familiar além de compromissos profissionais, reuniões, almoços, jantares e viagens de negócios. Fora isto, trouxe a renovação da paisagem urbana, do meio ambiente, da verdadeira visão das cidades sempre deformada pela quantidade de veículos e de pessoas dormindo nas ruas. Da percepção de tanta gente sem saneamento básico em seus lares. Trouxe a reflexão sobre uma base econômica de milhões de desempregados, milhões de empreendedores informais, de uma distribuição de renda injusta e de uma desigualdade social desumana.” Podem, sim, ser constatações simples para quem pensa humanamente, mas, jogou luzes em algo nem sempre percebido e tem um peso significativo para o futuro que vem chegando. Falcão pontuou, ainda, aspectos que, aliás, combato constantemente que é a falha estrutural do nosso setor Educação. “Nosso sistema educacional pode ser alterado completamente pelas novas tecnologias, aulas virtuais, links educacionais, maximização do uso de canais de televisão... A renovação dos processos de aprendizagem”.
Como economistas, tanto ele quanto eu, não poderíamos esquecer de comentar as possibilidades que a crise abre para a valorização de segmentos econômicos desprezados como é o caso dos milhões de motoqueiros, odiados pelos que transitam normalmente a bordo dos seus automóveis, e que se tornaram valorizados com a recente onda de entregas, pedalando suas motos ou bicicletas, incansavelmente, sem qualquer aparato legal que os garanta futuro promissor. “A Covid-19 trouxe a necessidade de suprir aqueles com uma renda mínima para sobreviver e tirou a coberta do estado real da saúde dos povos, pois o Covid-19 só mata os milhares que já estão com saúde precária.” Lembrou meu interlocutor. E lembrou bem. Na esteira desse aspecto, lembramo-nos que a Covid-19 mostrou que os mais complexos e caros equipamentos médicos de alta complexidade não substituíram a necessidade de coisas tão simples quanto máscaras e respiradores nos hospitais sucateados com escassez de leitos de UTI.

Dessa forma e concluindo, concordo com a tese do amigo de que o Coronavírus matará muitos, mas, ressuscitará a humanidade. Desse Mal, então, devemos tirar lições severas com vistas ao Bem do mundo que teremos a remontar: harmonia entre os poderes, democracia, solidariedade entre as nações, investimentos em pesquisa e modernização para incrementar as produtividades agrícola, industrial e de serviços, cuidados nunca antes enxergados para a saúde pública, educação e segurança, amor à população idosa, entre outros aspectos secundários., embora não menos importantes. É um formidável desafio. Mas, será um Bem inestimável.      

Nota: As ilustrações foram obtidas no Google Imagens
 

domingo, 5 de abril de 2020

FREIO DE ARRUMAÇÃO

É sabido popularmente que quando um ônibus está lotado e os passageiros de pé insistem em permanecer próximos à porta de desembarque, mesmo havendo espaço vago em boa parte do coletivo, o motorista matreiro dá um freio brusco que, pegando de surpresa os conduzidos, espalha gente por toda área disponível. A essa estratégia se chama de “freio de arrumação”. Pois bem, em tempo de quarentena, tenho visto a situação imposta pela Pandemia do Coronavírus como sendo um freio desse tipo à Humanidade. O mundo inteiro estava numa corrida sem limites na busca do possível e do impossível entregues às asas do imaginário coletivo e da fantasia. Posso estar equivocado, mas antevejo tempos em que iremos enxergar com nitidez onde erramos e como contribuímos para construir o caos que estamos experimentando. Não! Não vou apelar para referenciais religiosas e, muito menos, políticos que muitos usam na tentativa de explicar. Esses já estão bem explorados. Ao invés disso vou tentar explorar algumas vivências e reflexões que fiz ao longo da vida. Para inicio de conversa, tudo me leva a crer que o mundo será outro quando sairmos dessa “viagem” dentro de quatro paredes. É, um mundo novo está nascendo.
O fenômeno da urbanização acelerada e tresloucada pode ser vista como um bom dos  exemplos mais concretos e, indiscutivelmente, revela a ponta de um tremendo iceberg. É nesse cenário que vi e nunca entendi o porquê das extravagâncias dos nossos jovens em termos de consumo de álcool e drogas, ilimitadamente, mesmo que alertados pelas possíveis consequências maléficas. Menos ainda pelas irrefreáveis curtições das orgias sexuais. O HIV respondeu duramente e estabeleceu seu freio de arrumação.  Ainda assim, nossos jovens se excederam. Muitos vivem hoje sofrendo as consequências indesejáveis. Pintaram e bordaram desbragadamente, até agora. Tocaram fogo a eles próprios. Lembremo-nos do incêndio na discoteca Kiss (Santa Maria – RS) que foi um exemplo trágico. Observem que a História mostra haver sido a industrialização maciça e a produção de serviços que provocou a migrações de grandes levas populacionais para os gigantes centros urbanos de produção, atraídos pela elasticidade da oferta de empregos e as promessas intermináveis de sucesso. Sem esquecer da vida infinitamente mais lúdica. O resultado desse fenômeno são as favelas das grandes urbes do planeta e uma população apinhada em espaços exíguos a despeite dos grandes espaços vazios, geralmente disponível no meio rural. No Brasil essa coisa é concreta e não vislumbro freio de arrumação que conserte a situação. Já observei quadros idênticos em metrópoles outras, entre as quais: Xangai, Caracas, Seul e Nova York. Nesta última, a grande metrópole mundial e dita Capital do Mundo, a coisa não é fácil. À exceção do que se observa na 5ª. ou Park avenues, onde magnatas se instalam nas penthouses douradas e vislumbram, passivamente do alto, os arredores com milhares de edifícios residenciais da charmosa Manhattan, onde vivem milhões de seres humanos apinhados em quitinetes apertadas e respirando ares comuns nem sempre recomendados. É um mar de imigrantes nacionais e estrangeiros. Desça na Estação Canal Street do metrô e se detenha a observar. No bairro do Village, a coisa é quase indescritível. São, na grande maioria, moradias de um único cômodo onde vivem três ou quatro pessoas. Ratos, baratas e muita pulga é coisa trivial. Vi com meus olhos. Frequentei, até. Ou seja, em Manhattan existe uma favela diferenciada tão insalubre como qualquer outra Brasil afora. Por isso, não me surpreendo quando ouço falar do avassalador ataque do Covid-19 naquela cidade. E a coisa não é diferente nas grandes cidades da Europa. Nem preciso falar...
"Favela" de Nova York
Numa viagem à China (2010) observei, em Xangai, a demolição de bairros populares inteiros e a população sendo transferida para edifícios nas franjas da metrópole. Populares também, mas com melhores condições de vida. Conversando com o guia da viagem fiquei sabendo que aquelas vilas típicas e de beleza original – à proposito, lindas – eram alvos de demolição, do Governo Central Chinês, com vista a erradicar focos de corriqueiras doenças contagiosas e que punham em risco a sociedade moderna da dinâmica e pretensa capital do Mundo (!). Foi também um freio de arrumação! Lembrei, na ocasião, que aqui no Brasil as populações em condições de risco só são deslocadas quando o espaço que ocupam (invasões, geralmente) deve dar lugar a grandes avenidas, obras de interesse do politico local e coisas semelhantes. Interesses para preservar a saúde pública é assunto marginal dos projetos.
Demolições do tradicional em Xangai  
Mas, voltando à ideia de Novo Mundo que pensei, acredito que, antes de qualquer coisa, os humanos serão necessariamente mais limpos. O exercício de lavar bem as mãos de agora será uma prática de rotina. As relações humanas serão mais solidárias. A natureza será mais respeitada. O reino animal, também. E, por fim, as relações político-econômicas, as internacionais sobretudo, vão sofrer a mais revolucionária das mudanças. O nacionalismo radical pode recrudescer, a divisão internacional do trabalho será revista, o mercado internacional, por consequência, será motivo de grandes encrencas e os grandes conglomerados econômicos vão tremer diante das novas ordens. Será um processo penoso e de longo prazo. Quem viver verá. E que se segure porque o freio de arrumação vai ser inexorável e vai pegar a todos. Pior, porque sem surpresa.

NOTA: Fotos obtidas no Google Imagens                    

Lição para não Esquecer

Durante a semana passada acompanhei com interesse de quem viveu a historia, as manifestações que relembraram o golpe militar de 1964. Com um...