domingo, 28 de abril de 2024

Haja Cravos

Neste recente 25 de abril lembrei-me demais das minhas andanças em Portugal. Recordo da minha primeira visita, no longínquo verão de 1969, quando tive a oportunidade de observar um país sob o domínio de uma tirana ditadura, desde 1933. Era assustador perceber na fisionomia do cidadão comum as marcas da repressão e os temores que se multiplicavam no país. Naturalmente, à época, pude comparar com o que se vivia no Brasil, sobretudo após a decretação do AI5, no ano anterior, e alimentar o temor de que mergulhássemos em algo semelhante. Foi uma experiência marcante na minha formação de cidadão democrata. António de Oliveira Salazar era o Carrasco não apenas do Portugal europeu mas, também, massacrava com mão-de-ferro um Império Colonial, àquela altura inviável, explorando as riquezas das colônias revoltadas em territórios africanos e asiáticos, subjugados secularmente às leis ditatoriais implacáveis do chamado salazarismo. Circulando nas ruas e avenidas das grandes cidades portuguesas percebiam-se a timidez e o temor do cidadão comum, sempre sob a mira da policia, inclusive a secreta, mantida pelo regime. Portugal, comparado com as outras nações europeias, pelas quais circulei, se apresentava com um clima sombrio e triste. As pessoas, sobretudo as mulheres, trajavam roupas austeras e excessivamente formais, embora fosse pleno verão. Preto, marrom e azul-marinho eram as cores predominantes. As vitrines do comércio da época eram pobres, démodés, desatualizadas e pouco atrativas. Sem colorido! Ali bem perto, em Londres, Mary Quant ditava o uso das minissaias e os Beatles explodiam nas paradas de sucesso. Enquanto isso, as portuguesas andavam pálidas e desbotadas, sem o colorido do pós-guerra que dominava o mundo. Havia proibições curiosas como, por exemplo, a da produção e venda de Coca-Cola, substituída por algo similar com uma denominação local que não recordo. Contudo, como para todo mal há sempre um fim, chegou o dia da derrocada e, há 50 anos, em 25 de abril de 1974, as saturadas Forças Armadas de Portugal, com forte apoio popular, derrubaram uma das mais longas ditaduras da História, num vitorioso episódio que terminou recebendo a denominação de Revolução dos Cravos devido ao fato de que a população distribuiu cravos vermelhos aos soldados que executaram o movimento. Salazar já não existia, morreu em 1970, e havia sido afastado por uma grave doença em 1968 e substituído pelo seu fiel seguidor Marcelo Caetano, que manteve o regime até que foi derrubado, em 1974.
O 25 de Abril se tornou uma data histórica e vem sendo festejada a cada ano de maneira monumental. Neste 2024 as comemorações se agigantaram devido ao caráter “redondo” do aniversário. Jubileo de Ouro! Apresso-me em registrar a comemoração no Blog e manifestar o meu regozijo. Gosto demais de Portugal e sempre que possível volto lá. Já voltei várias vezes. Por sinal, tive a alegria de andar por lá, em 1975 quando experimentei a alegria de assistir na Avenida da Liberdade, principal artéria de Lisboa, as comemorações da data. Folgo em registrar que há uma imensa diferença entre esses dois tempos.
O Portugal de agora é uma festa para os olhos e para a alma. Há um colorido especial, uma vida vibrante. Após queda do regime, o país se modernizou se abriu ao mundo e as cidades oferecem sempre aos visitantes um clima de festa com sabor incomensurável e provocando a vontade de retornar. Haja cravos para comemorar todos os dias. O país faz parte da União Europeia, ganhou progresso, desenvolvimento e se tornou um dos locais mais seguros da Europa, ganhando destaque como atrativo para os investidores internacionais e, de modo especial, um dos mais demandados pelo turismo internacional. Salve Portugal, salve a Democracia e haja cravos hoje e sempre. NOTA: Fotos ilustrações obtidas no Google Imagens.

quarta-feira, 10 de abril de 2024

Lição para não Esquecer

Durante a semana passada acompanhei com interesse de quem viveu a historia, as manifestações que relembraram o golpe militar de 1964. Com um abrir e fechar de olhos completa-se 60 anos. Parece até que foi ontem. Eu era muito jovem, pré-universitário, e dava meus primeiros passos de cidadania buscando “tomar pé” no mar revolto no qual me via mergulhado. Recordo bem aquele 31 de março, quando o rumo político do país sofreu uma brusca “virada-de-chave” conduzindo-o para um tempo de incerteza e escuridão. Vivia-se um mundo completamente diferente do que hoje experimentamos. Era um tempo pós-guerra ainda tentando se restabelecer do grande trauma da II GG, mas às voltas em conviver com outro conflito, não necessariamente bélico, que era a chamada Guerra Fria, sendo travada entre os Estados Unidos e a Rússia na disputa acirrada pela hegemonia politica mundial. Um conflito que, na prática, servia de pauta e apontava caminhos para muitas das sociedades em vias de estruturação ou revisão político-social, seja nos padrões socialistas soviéticos ou nos ditames capitalistas ianques. A América Latina era um dos terrenos mais cobiçados pelas duas partes litigantes. À época, por exemplo, os russos comemoravam a reviravolta politica operada em Cuba e a instalação do Governo de Fidel, permeado de ações que assustavam meio-mundo. A dupla Fidel Castro/Che Guevara e o Paredão Cubano eram temas diários no mundo Ocidental. Assustados, os Estados Unidos buscavam, apressadamente, meios de se proteger e de dominar o que eles sempre consideraram de seu próprio quintal. Quem viveu sabe o que aconteceu. Os ianques exerceram pressão político-econômica e o Brasil entrou nesse beco sem saida. Indiscutivelmente, uma História longa e cheia de capítulos eletrizantes, com rebatimentos graves, ainda hoje remoídos, no Brasil e nos vizinhos Argentina e Chile. Mas, não é o tema central desta postagem. O assunto mesmo é o Golpe Militar de 64, chamado pelos mentores e simpatizantes de Revolução. O movimento apanhou o país numa verdadeira encruzilhada politica, com uma sociedade perplexa face às situações desenhadas pelas polarizadas correntes progressistas e conservadoras reinantes.
Pernambuco, estado sempre atuante e líder, muitas vezes, em todo e qualquer movimento politico nacional foi apanhado pelo Golpe abrigando em seu sítio iniciativas vanguardistas e de princípios contrários às novas ordens dos militares no Poder. Daquela época, são sempre lembradas, entre outras, as Ligas Camponesas, orientada por Francisco Julião (Deputado Federal na época) – defensora do projeto de Reforma Agrária universal e benéfica à população carente e sofrida nas mãos dos grandes latifundiários – e o Movimento de Cultura Popular (MCP) de Paulo Freire e Luís Mendonça. Para completar, era Pernambuco local onde se instalava uma das maiores iniciativas de intervenção local do Governo Federal que foi a SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, Agencia oficial de caráter regional, encarregada de promover o desenvolvimento socioeconômico regional, idealizada e dirigida por uma das mais brilhantes cabeças do país, que foi o paraibano Celso Furtado. Foram tempos sombrios e aterrorizantes. A ordem dos “poderosos” era aniquilar projetos e pessoas que de algum modo fosse comprometido com referenciais socialistas, de pronto rotuladas de comunistas. Muitas arbitrariedades foram cometidas, muitos inocentes e muitas inteligências foram sacrificadas. Extermínios de muitos e evasão (exilados políticos) passou a fazer parte do dia-a-dia do brasileiro comum. Todo mundo, em principio, estava sujeito às rigorosas ordens dos milicos.
Recém-admitido nos quadros de funcionários da SUDENE lembro bem do pavor que minha mãe alimentou ao ver na revista semanal O Cruzeiro uma matéria de capa que taxava a Agencia Regional de Gaiola Dourada com pássaros vermelhos. A censura à imprensa, a quebra de sigilo pessoal das correspondências e os agentes secretos nas universidades (apareciam de repente e sem prestar vestibular) e repartições públicas foram outras características do período. Ex-bolsista da USAID (United States Agency for Intenational Development) passei a receber pelo Correio, em 1968, publicações de autores norte-americanos, todos eles combatendo o regime comunista soviético e as doutrinas socialistas. Os títulos eram sugestivos para que um agente mal informado e inadequado no posto concluísse se tratar de literatura subversiva. O jumento do censor não percebia que cada livro trazia um carimbo ostensivo informando se tratar de cortesia da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil. Por conta disso fui tido como um elemento subversivo social e, desse modo, levado de camburão para prestar depoimento na Secretaria da Segurança Publica. Mais do que isto e, para meu desespero tive meu passaporte retido pela Policia, três dias antes da minha primeira viagem à Europa. Inocente, fui salvo pelo Delegado do SNI, na SUDENE, que colocou as coisas no correto lugar. Tive o passaporte liberado e fiz a sonhada viagem à Europa. Recordo, por ouvir falar, do caso de um famoso Professor de Direito, Glaucio Veiga, que ao ter a residencia invadida para uma vistoria viu seu longplay Romanticos de Cuba ser arrolado entre os itens subversivos encontrados! Ah! Não foi fácil viver aquele tempo. Foi uma lição para não esquecer. Fico, hoje, impressionado com o desejo de muitos brasileiros pregando uma tomada do poder pelos militares, a exemplo de 1964, em resposta aos desmandos e corrupções dos muitos que passam pelos gabinetes e corredores de Brasília, sem que façam ideia do risco que correm. Ora, meu Deus, existe soluções muito melhores do que esta. Por outro lado, fico pasmo diante dos afagos e benesses politico-financeiras outorgadas pelo atual Presidente, Luís Inácio Lula da Silva, a sanguinários ditadores latino-americanos principalmente Maduro, da Venezuela e Ortega, da Nicarágua, ao messmmo tempo em que se ocupa em fazer discursos em defesa da a Democracia. Só sendo piada de mau gosto. NOTA: Fotos ilustrações colhidas no Google Imagens.

Haja Cravos

Neste recente 25 de abril lembrei-me demais das minhas andanças em Portugal. Recordo da minha primeira visita, no longínquo verão de 1969, ...