Gosto sempre
deste mês de Junho, no Nordeste, porque nele geralmente fazemos uma pausa na
correria do dia-a-dia para curtir uma festinha caipira. Gosto que me enrosco. Come-se
milho, canjica e pamonha, garrasecamuié
e arrastarospé num forrozinho
aprumado. Neste ano então a coisa veio em boa hora diante da crise que nos
perturba.
Independente
da crise, veja só como o tempo está passando rápido. Junho está acabando e com ele metade do ano. Ano difícil. Nada
evoluiu e as preocupações só se multiplicam. Por mais alienado que seja o
cidadão, com relação às futricas políticas e econômicas do país, não tem sido
fácil relaxar. O “caldeirão da república” está em constante ebulição. A pressão
é grande, até para quem vive como observador, como é meu caso. Além de vitima,
é claro! Por isso mesmo que a paradinha do São João veio em boa hora. Cada um
para quando lhe é possível. Para mim, foi. Já nossos parlamentares tiveram que
ficar em Brasília para curtir o bafafá da Corte de D. Dilma. Afinal, alguém tem
que trabalhar!
Como quase
todo ano tomei o rumo do poente e fui bater onde as plagas da família, banda
dos Mendonça, em Fazenda Nova (*), onde a noite de São João é festejada à moda
interiorana e leva a gente, que tem raízes familiares ali fincadas, viver
momentos de congraçamento familiar e de reminiscências refrescantes.
Festejos
familiares à parte, diga-se que excelentes e caprichados, impossível não notar
as dificuldades que se tem atualmente para manter a tradição. Há sempre uma invenção
de modernidade aqui ou acolá, que termina desvirtuando o que havia de pureza e
brejeirice do passado não muito distante. Fogueiras são queimadas, é verdade. Até
porque os mais velhos mantêm a tradição, mas, as antigas quadrilhas ficaram
descaracterizadas e cheias de novidades que não combinam com a tradição e
história da festa. As “matutas” e os “matutos” de hoje em dia dançam uma
quadrilha modernosa,
vestem fantasias temáticas (vide foto acima) e encenam alegorias extravagantes.
É quase um carnaval. Inteiramente diferente do que se faziam no passado. Os “alavantu”
e “anariê” de antigamente passam longe dos salões e pátios de festejos. Tenho
saudades de ver crianças queimando inocentes estrelinhas, riscando caraduras
coloridas, soltando um fumarento chuvisco de prata ou jogando diabinhos acesos
nos pés das menininhas assustadas. Alguns destes, fazendo jus à própria
denominação, subiam pelas perninhas saltitantes e iam bater nas calcinhas
cheias de babados. Um alvoroço geral. Muito ingênuo, apesar das perninhas e
calcinhas como objetivos da brincadeira dos meninos assanhados. Eu fiz isso
demais. Ou então, lembro que era divertido queimar mosquitão ou busca-pé... Não
havia coisa mais divertida do que perguntar a um amigo se iria “soltar rodinha
no pau de vassoura” na noite de São João. E estourar um peido-de-véia homenageando a vovó ou a uma tia idosa? Armaria! Era uma confusão quando
declarada a homenagem. Bom demais! Ah! Meus tempos! Quem tem mais de cinquenta
anos sabe do que estou falando. Azar de quem achar que sou saudosista... Os
meninos de hoje, nem se abalam. Ninguém chora ou bate com o pé, por um pacote de
fogos. Nem corre prá ver acender a fogueira! Ao invés disso, ficam enfurnados
dentro de casa, incomodados com a fumaça que se espalha no ar e agarrados com
um celular ou um tablet, jogando
vídeo-game. Desconfio que dentro de trinta anos essa coisa de festa junina vai
ser história do passado. A sociedade muda e muda com rapidez. Os costumes e
tradições são arquivados sem pena e sem deixar saudade. Precisamos defender a
cultura dos folguedos juninos, antes que passem a borracha.
Ali, um
pouco antes de Fazenda Nova, em Caruaru, onde se propala que é feito o maior
São João do mundo, a coisa está sendo muito criticada devido a descaracterização
dos festejos. Os mais velhos afirmam que o que era bem típico deu lugar a um
megaevento, que está mais para carnaval do que qualquer outra coisa, com forte apelo
comercial e distante do que se realizava há vinte ou trinta anos. As atrações
já não são mais os valores artísticos locais e, sim, os nomes de sucesso no
cenário nacional, que de modo geral ignoram os ritmos e músicas regionais. Tudo
para atrair público e render mais. Muito mais!
Está se
formando, desse modo, uma geração que vai seguir rumo ao futuro sem noção do que significa
uma autentica manifestação junina. Santo Antonio, São João e São Pedro serão
apenas imagens na igreja da matriz da cidade.
Fiéis às
tradições, ainda conseguimos realizar, em família, um autêntico pé-de-serra, contando com um trio composto
de sanfona, zabumba e triângulo. (Foto acima). Rolou Luiz Gonzaga, Dominguinhos e Zé Dantas a
noite inteira. Para forrar o istambo comemos
sarapatel, cabidela de galinha e guisado de penosa, acompanhado de farinha da
terra e xerém salgado, regados com bons vinhos. E ruins também, porque faz
parte. E não deixamos de comer canjica, pamonha e milho cozido. Bom danado. Deu
até pra esquecer a crise! Viva São João!
(*) Distrito do Município de Brejo da Madre de Deus, situado
a 180km. Distante do Recife.
Nota: Fotos obtidas no Google Imagens, exceto a do trio pé-serra, da autoria do Blogueiro.