sábado, 27 de novembro de 2021

Água Gelada na Fervura

O mundo tentando esquentar a retomada da vida e uma nova onda do vírus ameaça o processo. Ômicron é a novidade da semana. Uma nova variante identificada na África do Sul e com suspeitas de casos pelos demais continentes. É o que chamo de “agua gelada na fervura”. Um amigo prefere dizer que “botaram água na cerveja do carnaval”. Além de ser uma descoberta inesperada e desagradável é, também, mais um sinal de que nem tão cedo vamos nos livrar dessa peste. A coisa parece tomar força na Europa, em plena estação do frio e das nevascas, onde países que aparentemente tinha a coisa controlada, com bons percentuais de vacinas aplicadas, já se mobilizam para retomar as medidas de precauções. Alemanha (passando pelo pior momento da pandemia), Holanda, Itália, Áustria e França são países onde a 4ª onda já se faz presente. Noticias atualizadas (27.11.21) pela Agencia Reuters, Italia, Alemanha e Reino Unido já registram casos com a nova variante. Em Milão, um passageiro procedente de Moçambique testou positivo para esta nova variante. Mau sinal. O virus vai se espalhar rapido.
No último dia da semana, os pregões das bolsas de valores, do mundo inteiro, reagiram de modo negativo e os negócios caíram vertiginosamente em quase todas as praças, sob o pavor dos efeitos danosos na economia. No Brasil o índice Bovespa caiu 3,39%, fechando a semana no prejuízo. Numa sintomática decisão do Governo Brasileiro, coisa que surpreende devido ao histórico recente, as fronteiras do País estarão fechadas a seis países do sul da África (África do Sul, Botsuana, Eswatini, Lesoto, Namíbia e Zimbabue), onde o ômicron já é detectado. Ao mesmo tempo, o mais surpreende, aqui no Brasil, são as providencias contrárias como se tudo fosse passado e a pandemia seja uma página virada. Não se fala noutra coisa – a exceção das costumeiras trapalhadas políticas – a não ser dos preparativos para as festas de réveillon e carnaval. O Rio de Janeiro prepara um grande desfile de escolas e os ingressos para as arquibancadas se esgotaram no primeiro dia de vendas. São Paulo, também. Ora, se não houvesse ocorrido o carnaval de 2020 a nossa história seria outra. Mas, não. Há organizações como a do “O Galo da Madrugada”, maior bloco de rua do mundo (!), aqui do Recife, já escolheu tema (Viva a Vida, Viva o Frevo), monta suas alegorias e marca ensaios. Entidades de classe médica e científicas, locais e nacionais, já se manifestam oficialmente contrárias, alertando para os altos riscos de uma recidiva da pandemia. Conforme as noticias veiculadas pelos meios de comunicação, a vacinação tem sido um sucesso no país. A população tem sido receptiva, ao contrário de muitos países lá fora. Contudo, os especialistas sugerem a manutenção dos cuidados, uso de máscaras e assepsia das mãos com álcool. E avisam: é cedo para abrir de vez. Assustador é também saber da hipótese de que as vacinas hoje administradas venham a ser ineficazes para o tal do ômicron. Mesmo dando o desconto do sensacionalismo da imprensa é de se ficar atento com os próximos dias. Afinal, não esqueçamos de que o vírus original continua sendo pouco conhecido, as vacinas são ainda emergenciais e... Bom, que o futuro ainda é incerto. Diante deste quadro e desta modesta plataforma, cabe um apelo para que as autoridades “reinantes” usem do bom senso e decidam pelo melhor e, sobretudo, pensando na população. Pelo menos desta vez. NOTA: Charge de NANDO MOTA obtido no Google.

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Talentos Encantados

Nestes tempos sombrios da pandemia, a tristeza parece ainda mais triste do que sempre foi. Além do recolhimento forçado venho contabilizando perdas dolorosas de pessoas queridíssimas, inclusive uma irmã, resultando num vazio d´alma difícil de preencher. Dizem ser sentimento de quem muito vive. Mas que é um coisinha difícil de ser vivida, isto é indiscutível. Certa feita, conversando com a grande Dama do teatro pernambucano – Geninha da Rosa Borges – ao completar seus 90 anos, ouvi dela uma assertiva que guardo e, foi não foi, recordo. Segundo ela, “envelhecer pode ser mesmo uma dádiva divina... Contudo, é duro ver partir para a eternidade muita gente querida... dói muito.” De fato, ainda que um pouco distante dos 90, começo a sentir o peso dessa verdade. Gente iluminada, cabeças brilhantes, talentos singulares se encantam deixando-me (deixando-nos) para trás. Muitos partem sem tempo dar um “até logo”. Dias recentes perdi amigos talentosos e verdadeiros ícones da cultura local. Primeiro, em setembro, foi a partida do exímio violonista e compositor Henrique Annes; logo depois, no mês de outubro, foi a vez do grande Maestro Rafael Garcia e, na ultima semana de outubro, o compositor e meu grande amigo do peito, Severino Luís de Araújo, a quem dedico o espaço do Blog neste fim-de-semana. O clima é de luto no cenário musical pernambucano. Foram três perdas lamentáveis. É numa hora dessas que me ponho a questionar o velho ditado do “ninguém é insubstituível”. Conheci Araújo nos idos dos anos 70, quando casando com a minha dileta colega sudeniana, Adelina Freitas de Araújo. Vivíamos os áureos tempos dos combates à pobreza nordestina. Ele no Condepe, depois na Codevasf e nós (eu e Adelina) na velha SUDENE, a verdadeira. Éramos, na realidade, três jovens economistas envolvidos pela missão de desenvolver o Nordeste.
De origem humilde, na Paraíba, Araújo veio, ainda menino, com os pais e irmãos, para ganhar a vida em Pernambuco. Deu certo para a família e para o menino da Vila de Araçá (atual município de Mari) se tornando homem de destaque na Terra de Nabuco. Inquieto, experiente profissional e bem relacionado, Severino Araújo ganhou o mundo e terminou atuando com louvor em inúmeras frentes profissionais nos poderes executivo e legislativo nacional. Mas o profissional atuante trazia na veia outra rara habilidade voltada ao domínio poético-musical, sobre a qual prefiro destacar. Não mais importante do que as demais habilidades, mas, seguramente, a que mais estreitou nossa amizade. Acompanhei a vitoriosa vida desse compositor, desde sua estreia triunfante com o frevo-canção “Morena Azeite” (1984), a grande campeã do IV Frevança (Festival de Frevo e Maracatu), promovido pela Rede Globo de Televisão. Foi a primeira grande vitória na condição de autor de um frevo. Depois dessa vitória, sustentada pela voz do saudoso cantor pernambucano Expedito Baracho, outras inúmeras se seguiram em Pernambuco e na Paraíba. Não tardou muito e o nome do nosso amigo se notabilizou Brasil afora. Muitos famosos disputaram interpretar suas composições, entre os quais: Claudionor Germano (rei do Frevo), Ivanildo Silva, este interpretando “Sem Você Eu me Dano”, composição campeã, no V Frevança, Guadalupe, Valéria Moraes, Cristina Amaral. Por sorte, Araújo contou com arranjadores de mãos-cheias como José Menezes, Ademir Araújo e Duda. Enfim, foi uma sequencia elástica de sucessos musicais entremeados de contos e belos sonetos, revelando, sempre, um ser de extrema sensibilidade e muito humanismo. Mas, como sendo pouco, Severino Araújo enveredou, com igual sucesso e nas últimas estações da vida, pela popular arte da Cantiga de Cordel. Como sempre dedicou tempo e talento compondo verdadeiros poemas depois publicados no livro “A Vida não É Cor-de-Rosa” (2019), onde, por felicidade, deixou sua autobiografia para os que gozaram da sua convivência alegre e gentil. A propósito, sendo hoje, 19 de Novembro, o dia do cantador/cordelista, conforme lembra o Imortal José Paulo Cavalcanti (Jornal do Comercio, 19/11/210), torna-se oportuno homenagear Severino Luís de Araújo, um talento encantado no último 27 de outubro, com um belo cordel da sua autoria: Muita tolerância e fé/ Pratiquei na minha vida/ Bati em todas as portas/ Fui em frente na corrida/ Tenho orgulho do que fiz/ Sonhando em ser feliz/ Todos me deram guarida. NOTA: Foto obtida no Facebook

terça-feira, 9 de novembro de 2021

Economia Criativa

Ando colocando a cara no mundo tentando, com todos os cuidados, voltar ao normal. É curiosos como essa coisa de ficar “dendecasa” vicia. A internet facilita demais as coisas da vida e o cidadão chega a perder o “desembaraço” costumeiro de cair na rua, ir ao supermercado, ao shopping e outros lugares comuns. Preguiça ou a idade? Tenho achado que o transito está pior. Parece que todo mundo resolveu sair de vez. Até a cidade parece outra. Fico na dúvida: sou eu somente ou todo mundo sente essa estranheza? Bom, deixa pra lá... o assunto de hoje é outro. Como ia falando, tenho colocado a cara no mundo e, neste fim de semana passado, circulei em restaurantes e bares da vida. Mais do que isso, a convite do meu filho e minha nora, fizemos, com minha esposa, uma escapada pela zona da mata de Pernambuco indo à cidadezinha de Tracunhaém (formigueiro em tupi-guarani) localizada a 80km do Recife, com a intenção de ver de perto a produção de cerâmica utilitária e figurativa da cidade. O local é berço de muitos ceramistas famosos, com famas nacional e internacional. Até ja foi cenário de novela da Rede Globo de televisão (Coração Alado, com Tarcísio Meira no papel principal).
Uma boa rodovia federal (BR-403) nos leva praticamente até lá. Paisagens exuberantes da Mata Atlantica e dos canaviais pernambucanos para encher a vista de quem passa. A cidade é bem pequena, com menos de 15 mil habitantes e o IDH gira em torno de 0,650. É, certamente, uma taxa mediana. Acredito que a proximidade da Região Metropolitana do Recife facilita a vida daquela gente que pode não ser tão difícil. Apesar disso, circulando pelas suas ruas estreitas, altos e baixos, poucas praças, os sinais regionais de pobreza chegam a ser visíveis. Mesmo assim é de se enaltecer as inteligências e habilidades artístico-culturais de um povo que soube capitalizar as chances de desenvolver o que se chama, modernamente, de economia criativa, com base na arte da cerâmica de terracota (barro cru ou queimado) que terminou projetando a cidade no resto do Brasil e no Mundo.
Mestres da mão-no-barro se tornaram famosos e fizeram história deixando um legado que vem sendo preservado com orgulho e muita criatividade por uma gente hospitaleira. Entre esses se destacam: Zezinho, Nuca, Dona Nóca, Mestre Zuza, Maria de Nuca, entre vários outros. É formidável admirar de perto as formas cerâmicas que são boladas pelas calejadas dos artesãos locais e perceber a pegada de uma gente que se dedica, de corpo e alma, numa forma lúdica de viver e economicamente efetiva para seu digno sustento
Um traço marcante na arte cerâmica de Tracunhaém ficou “imortalizado” pelas mãos de Nuca (falecido em 2015) e seus discípulos (foto logo acima), que é o Leão Cacheado. Virou clichê de todos os documentários e afiches que se referem ao sitio cultural da cidade e, inclusive, do estado de Pernambuco. Seus trabalhos já foram expostos no exterior e seus leões cacheados estão pontificando em praças públicas, como no Primeiro Jardim, da praia de Boa Viagem, no Recife, e no Jardim do Sitio de Burle Max, no Rio de janeiro. Foi uma bela escapada, no fim de semana, e uma boa oportunidade de observar de perto um exemplo de economia criativa. Sugiro que visite Tracunhaém para ver um Pernambuco raiz. NOTA: As fotos ilustrativas são da autoria do Blogueiro.

Lição para não Esquecer

Durante a semana passada acompanhei com interesse de quem viveu a historia, as manifestações que relembraram o golpe militar de 1964. Com um...