quarta-feira, 13 de maio de 2020

Redes para poucos

É sabido que do seio das grandes crises surgem novos inventos, avanços tecnológicos e soluções para grandes problemas, que terminam transformando, de forma radical muitas vezes, o dia-a-dia da humanidade. Os exemplos estão registrados largamente e, na grande maioria, são saudados com entusiasmo. Excluindo, naturalmente, aqueles inventos que instrumentaram ou instrumentam confrontos bélicos pondo em risco a segurança global.
Também é sabido e vem sendo esperado amplamente que a crise sanitária provocada pela pandemia da Covid-19 vem desenrolando uma esteira de imensas mudanças na maneira de viver das sociedades. Nivelados, por baixo, continentes e países voltarão às ruas com novas roupagens e desenvolvendo novos hábitos.
Se não nas ruas, homens e mulheres, de agora para frente, vão se abrigar no recôndito dos seus lares, mais do que nunca, apoiados pela grande invenção do século 20 que é a Internet. Não é bem uma coisa nova. Mas, que colocou de vez suas estruturas à vista, isto foi novo. É dela que estamos nos valendo nesses dias de quarentena. Sem chances de deslocamentos habituais, as famílias estão descobrindo com mais clareza a importância e praticidade dessa verdadeira arma de sobrevivência inventada na década de 60 do século passado. E nasceu no seio da grande crise provocada pela Guerra Fria, travada entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética, na busca da hegemonia mundial. Era um instrumento de segurança dos ianques, que tinham como objetivo guardar em extremo segredo seus arquivos estratégicos em varias instâncias e por meio eletrônico. Guardar tudo de precioso no Pentágono (Centro da Inteligência Norte-americana) seria um risco sem tamanho. Descentralizar era necessário e foi iniciado com o primeiro e-mail emitido no mundo, em 1971, direcionado aos “ramais” da Agência Central de segurança norte-americana. Passado algum tempo e em face das possibilidades do fim da Guerra Fria, que se consolidou com o colapso da União Soviética, derrubada do muro de Berlim e outros episódios adjacentes, no final daquela década, o que era “instrumental secreto” foi socializado e revolucionou as comunicações no mundo. Institutos de pesquisas norte-americanos receberam concessões de uso e os resultados práticos são hoje traduzidos pelos tantos dispositivos e aplicativos que tornam a vida global mais fácil e melhor informada.
Num artigo assinado pelo Professor J. P. Allain Teixeira (UFPE) e publicado no Diário de Pernambuco (12.5.20) encontrei uma citação que traduz com exatidão o mundo em que vivemos: “tarefas cotidianas cada vez mais são realizadas através de computadores, tablets, e smartphones em um processo de intensa redefinição das formas de experiência no tempo e no espaço”. Pura realidade. Foi a crise do Coronavírus que consolidou essa “preciosa” arma tecnológica que Teixeira chama de “quintessência do capitalismo global”. Na vigência das quarentenas, as atividades de home-office, encomendas via aplicativos (alimentos e remédios), comemorações natalícias, bodas e similares (aplicativo Zoom), homebank  e, até, divórcios e outros registros oficiais, entre inúmeras outras facilidades são executadas com um simples enter.
A fantástica Rede Mundial
Mas, como nem tudo são flores, é doloroso perceber que este instrumental de vanguarda é privilegio de poucos, mundo afora e, principalmente, em países como o Brasil, onde a pobreza tende a se alastrar devido, também e ironicamente, à mesma crise que traz esses avanços tecnológicos.
Um dos exemplos mais degradantes, no caso brasileiro, vêm sendo registrados na operação de pagamento da ajuda financeira governamental às pessoas sem emprego ou autônomos sem condições de trabalho, através da Caixa Econômica Federal. Observe, caro leitor ou leitora, que o que poderia ser resolvido com um enter, num dispositivo eletrônico qualquer, e livrar o “penitente” de uma fila desorganizada e escorchante, sem falar do risco de contribuir para a propagação do vírus, se revela impossível diante da indisponibilidade individual de um instrumental adequado ou de simplesmente não saber ler! Ocorre que muitos têm celular com o aplicativo de WhatsApp mas utiliza, tão somente, o dispositivo de voz. Pode até ser uma vantagem, mas não é suficiente. São situações como esta que expõem a cara de um país onde a educação nunca foi prioridade de fato.
O novo mundo que se aproxima
vai escancarar ainda mais essa pobreza estrutural e, no caso brasileiro, aprofundar o fosso que marca o ambiente social. Sem educação nada vai mudar. Nem a saúde, inclusive. E com esses governantes aí...
Redes sociais existem. Mas, para poucos. Que Deus acuda os que não têm onde se “balançar”.
E não duvide porque lembrando Lulu Santos: “Nada do que foi será / De novo do jeito que já foi um dia / Tudo passa, tudo sempre passará / A vida vem em ondas / Como um mar / Num indo e vindo infinito ...” 

NOTA: Ilustração obtida no Google Imagens

 

8 comentários:

Ranulfo Cunha disse...

Isso mesmo, só usam o WhatsApp para voz e o Facebook para se exibirem e não sabem fazer mais nada nos seus smartphones caríssimos.

Vanja Nunes disse...

👏👏👏👏👏👏
Excelente

Geraldo Magela Pessoa disse...

Trabalho harmônico e complementar, em família, é assim que tem quer ser.
Parabéns.

Lucia Valença disse...

Gostei, parabéns. Vou compartilhar

José Paulo Cavalcanti Filho disse...

Penso que poderia ir mais longe, amigo. Para cadastrar, em vez de recorrer à internet, os governadores poderiam coordenar seus prefeitos, para fazer essa lista. E mandar para Brasília. Quantos fizeram? Nenhum. Temos 5.570 municípios. Os prefeitos mesmo poderiam coordenar. Quantos fizeram? Um. 5.569 ficaram mudos. Só para reclamar de Brasília. Esses políticos...

Leonardo Sampaio disse...

Parabéns, mais uma vez e semanalmente, clarevidentíssimo irmão Girley !
Reforças a Carta do Fórum II das nossas Academias de Ciências, realizado em novembro p.p. no belíssimo Espaço Ciência de Pernambuco - educação é a necessidade mais básica para a implementação do Progresso Local Sustentável !
Precisamos valorizar nossos professores (vide o exemplo asiático aonde, no Japão, até o imperador se curva para os professores primários !). E entender que a Escola e o ensino tem que ser o centro desse processo de Progresso Local Sustentável !
Divulga a Carta das Academias de Ciências no teu ótimo e international blog !
Forte, fraterno abração !

Maria Luiza Targino disse...

Li seu blog e concordo com a musica de lulu santos: nada do q foi sera...... vou te ligar para um papo. Abs

Ranulfo Cunha disse...

Isso mesmo, só usam o WhatsApp para voz e o Facebook para se exibirem e não sabem fazer mais nada nos seus smartphones caríssimos.

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