Aliás, forró, bom mesmo, só no interior. E, se for daqueles do tipo pé-de-serra, com um trio formado de sanfoneiro, zabumba e triângulo, é uma delicia.
Eu, sempre que posso, fujo da cidade e corro para o interior para curtir a noite de São João. Aproveito para rever irmãos, parentes e amigos de longas datas, no meio da festança. Foi o que ocorreu neste fim-de-semana prolongado, com a noite de São João no meio. Garrei minha mulé e me mandei pra Fazenda Nova, terra dos meus ancestrais.
Lá, no “feudo familiar”, hoje sob a liderança do meu irmão Gil Brasileiro, organizamos nosso forró pé-de-serra, comemos e bebemos todos os vinhos da adega e revivemos, saudosamente, momentos do passado. Lembramos dos que já partiram e festejamos os recém-chegados com muitos fogos, fogueira, milho assado, pamonha, canjica e pé-de-moleque.
Na hora da saudade, lembrei-me que, antigamente, chegava a me vestir de matuto – calças remendadas, paletó apertado, gravata mal-amanhada – e gritava várias quadrilhas. Mas, isso foi coisa da minha juventude. Hoje em dia, as coisas são bem diferentes. A quadrilha moderna já não tem seus integrantes vestidos à moda matuta. Ao invés disso, criam um guarda-roupa especial, mais lembrando fantasias carnavalescas, com muito brilho e sem remendos. A coreografia, nem se fala. Nem de longe, lembra a velha quadrilha ao estilo francês, cheio de reverencia e solenidade. Poucos são os jovens que se caracterizam de caipira. Parece até que há uma rejeição ao gracioso estilo brejeiro. Uma pena...
No triangulo geográfico formado por Caruaru, Toritama e Santa Cruz do Capibaribe e cidades vizinhas (incluindo Fazenda Nova e Brejo da Madre de Deus), pólo da moda e confecções do estado, isto se torna ainda mais flagrante. No período junino, as moçoilas aproveitam para exibir o último grito da moda. Não existe mais matuto! Acabaram com a matutice, minha gente!
Num encontro de sanfoneiros no Brejo, tive oportunidade de observar de tudo. Lembro da jovem vestida, insinuantemente, com uma blusinha transparente, por baixo um sutiã cheio de paetês e um short bem curtinho, tanto de cima pra baixo, quanto de baixo pra cima. O zíper devia ter, se muito, 3 cm! Era literalmente short. No palco tocavam um xóte, em baixo ela dançava dentro do short, bem xortinho... Passei sorrateiramente e recomendei: “muito bem menina, segura o xóte...” Sem saber direito, penso eu, o que é um xóte, a moderninha brejense olhou pro xortinho, deu uma levantada... não sei como, e seguiu, digamos que, com todo respeito, xoxotando! Tempos modernos.
Velho assanhado? Quem? Eu? De jeito nenhum! Velho cuidadoso com a moral publica interiorana. Na minha época as meninas eram tão recatadas... Ah! Meu Deus! Era mais emocionante.
Mas, ainda bem que, nem tudo está perdido ou se modernizou de vez. Há, ainda, alguma coisa preservada. Foi o caso que flagrei, no mesmo encontro dos sanfoneiros, no Brejo da Madre de Deus: de repente – quando um trio sapecou um forró, desses que o caboco já queimado diz logo: “êita que esta não tem pareia, é arretada” – duas mulheres se abraçaram e saíram dançando, rodopiando animadamente, no salão, sem medo de virar jacaré! Isto mesmo, sem medo de virar jacaré! Acontece que, nos meus tempos de menino, ouvi muitas vezes, dos mais velhos, que “mulher com mulher dá jacaré e homem com homem dá lobisomem”. Criança inocente, lá em Fazenda Nova, nas noites de bailinhos, no hotel do meu avô, eu torcia para que uma dupla de mulheres dançando virasse jacaré ali mesmo no meio do salão. Pense que quadro sensacional! As duas estribuxando e se arrastando pelo chão, abrindo o bocão cheio de dentes e assustando o magote de gente ali reunido para se divertir. Cheguei, muitas vezes, a planejar o lugar para trepar, na hora do “pega-pra-capar”.
Naturalmente que meu sonho nunca se tornou realidade e, a cada ocasião, eu ia dormir decepcionado. Imaginação infantil, daquela época, e pureza e espontaneidade interiorana preservada até hoje. Uma beleza! Veja no clip, anexado abaixo, a dupla sem medo de virar jacaré.
Para terminar, cabe um comentário indispensável: na Fazenda Nova atual, todo 23 de junho, acontece uma especial noite pirotécnica. Para o deleite dos nativos e deslumbre dos visitantes, trava-se uma verdadeira “batalha” com queimas monumentais de fogos de artifício. Por volta das 8 da noite meu primo Robinson Pacheco, lá da Nova Jerusalém, dá inicio ao festival, com uma queima que lembra a cena final do Drama da Paixão, na semana santa. Uma beleza para os olhos. A resposta vem, com um intervalo aproximado de meia hora, com a queima dos fogos do deputado local. Passados 40 ou 60 minutos, o Prefeito do município faz sua apresentação, com uma queima colorida e demorada. Finalmente, por volta da meia-noite, um magnata do cimento que escolheu o local como uma das suas bases no interior, dá o maior show pirotécnico que se tem noticia em Pernambuco. Este dura aproximadamente 30 minutos numa queima extravagante e de proporções indescritíveis.
O céu da minha velha e querida Fazenda Nova se enche de luz e cores e, aos poucos, se transforma numa atração turística, nas noites de São João.
Nota: Clip e foto do blogueiro.
13 comentários:
OXÊNTE MENINO, ADOREI O TEU BLOG VISSE.DEI MUITAS RISADAS. Lucinha.
Girley rindo me ví em tudo o que você descreveu. Entretanto a melhor das frases apesar de saudosa foi ler "Acabaram com a matutice". De fato meu amigo agora o que se vê mesmo é muita descarada "servengonhice" Um abraço ana maria
Girley, rindo me ví no que você descreveu. Entretanto a melhor das frases apesar de saudosa foi "Acabaram com a matutice". De fato meu amigo o que se vê hoje em dia é muita descarada "sem-vergonhice", até nas letras das músicas juninas. Ana Maria Menezes - Recife
Girley,
o bom que gente como sua família aí em Pernambuco, gente como meu amigo Rodrigo aqui na Bahia vai mantendo um tanto da tradição. Eu também me revolto, há cidades no interior da Bahia com São João de tri elétrico. Pode? Ri muito com conversa da moça que seguiu xoxotando...
As pobres moças se arriscam virar jacaré por como dizem "home tá difíci cuma que"...
Seu testo de São João é bom e muito apropriado! Valeu
Beijos. Maria
Girley, realmente você deve ter divertido muito com o xoté de Brejo, porque eu já me diverti só de ler seu blog. Mas, o meu São João não foi muito diferente do seu não. Para ser melhor só faltou os fogos pirotécnicos e vocês.
bjs.
Clécia
Girley,
Antes de mais nada, um grande abraço para você, para o amigo Gláucio e para o amigo Gil, onde no terraço de sua casa soboreamos gostosos vinhos sob o manto da lua e do gostoso frio de Fazenda Nova. O São João é ainda uma grande festa folclórica e regional, tem se modernizado, mas ainda mantêm em muitos lugares a tradição do pé de serra, relembrando o rei Luiz Gonzaga, Dominguinhos e tantos personagens da nossa música regional. Estou viajando para o Japão hoje, a convite da JICA, para participar de um Seminário sobre Gestão Pública, e na volta lá para o dia 07 de julho, lhe procuro para agente falar da experiência. Tem sido um grande prazer ler seus artigos no Blog.
Abraços,
Roberto Arrais
Caro Girley:
Que maravilha de São João! Lembro os que passei logo que cheguei no Recife na década de 70. Meu primeiro São João de verdade foi em Escada (cidade), chão de terra batida, cobertura de palha, triângulo, zabumba e sanfona. Tocaram até o triângulo afinar...
Hoje já ouvi muitos recifenses dizerem que não gostam de São João. Pudera, é exatamente como você contou! Ano que vem vou ficar aqui em Belo Jardim mesmo!
Um grande abraço,
Corumbá
Eita esse menino, / quem é cabra da peste, mesmo indo pro Japão,/daqui nunca se esquece./ Ei, feliz Rei do Baião,/que lá do Céu inda festeja / viva a São João!/Aqui vamos ficando de e-mail pra e-mail /assim sempre lembrando quando algo quiser / da Anbej divulgar não esqueça / ligue pro meu celular / daqui nunca saí /porém posso viajar pela imaginação / todo o mundo visitar / Até ao Japão já fui / pra Zélia ajudar / com Girley Fazenda Nova também pude visitar / Agradeço a você / por de mim se lembrar / farei sempre do trabalho / um alegre viajar Parabéns pelo blog / que muito apreciei / faz a gente reparar nas coisas de nossa terra /e também de além mar / história boa é assim /faz a criatividade aguçar. Abç, Marta Braga
Oi, Girley
Gosto muito dos seus artigos no Blog - Legal este novo! Estou viajando no dia 05 de julho para a Europa. No primeiro de agosto estarei de volta. Ando trabalhando num novo projeto para o qual vou convidá-lo para colaborar e, tenho certeza, você vai participar gostando muito - comece a se preparar pois vai ser meu primeiro convidado. A idéia nasceu da minha necessidade de aprender novas técnicas de programação de sites, dinâmicos e com base em banco de dados. Muito bom aprender desenvolvendo algo gostoso - literalmente - de fazer!Só para dar um gostinho de água na boca tem uma chamada http://www.dostemposdatigela.com.brSerá que você também já faz uso das tigelas na sua cozinha? Boas tigelas para vocie neste período!Um abração
Luciana Altino
Girley, maravilhosas as suas experiências!!! Lembrei-me que, no ano passado, nessa época, juntos estivemos comemorando o São João na casa de vocês, em Fazenda Nova. Revivi, em meus pensamentos, todas aquelas brincadeiras daqueles dias festivos... Lembro-me de você danado soltando fogos (daqueles que correm atrás da gente). Era um corre-corre na calçada da frente da casa e o caqueado de Soninha, com medo (ao mesmo tempo gostando), para dentro e para fora da casa; enquanto eu ,com tanto medo também, corria e chorava de tanto rir. Bom demais!!! Aquela turma toda junta jogando conversa fora, sob o céu iluminado da noite de São João.
Lembrei-me, ainda daquela época junina, que passávamos uns dias no Engenho Trapuá, de nossa querida amiga Lourdinha:comida para todos os gostos, sanfoneiro, até bacamarteiro tinha como atração. A fogueira (Virgem Santa!) era tão grande e alta que, na manhã segunte, ainda havia brasa que se podia assar o milho com casca e ele ficava bem docinho.
Girley, lembra da brincadeira de passar descalço sobre a fogueira em brasas? "Pia! Mai qui doidiça. Coidado, vi?" O homem que conseguisse andar na fogueira sem queimar os seus pés, seria o protegido pelo santo. Muita lembrança boa!! Nós vestíamos os nossos filhos à caráter e nos produzíamos também num estilo mais country. A fogueira exuberante iluminava àquele verde sem fim ao mesmo tempo em que nos aquecia. Próximos a ela, degustávamos um saboroso churrasco com bebidas para todos os gostos e tudo a que tínhamos direito... Que deleite! E o casamento matuto? Você foi o padre e ao mesmo tempo falava a quadrilha. Cunhado danado de animado!
Resumindo e concordando com você: São João só nu interiô, vi ?
Beijos, Graça Maria
Comp. Girley,
Foi-se o tempo de brincar São João, de olhar com tesão o "xote" das meninas.
Verdade! As "as quadrilhas" perderam o sabor da nossa infância. Verdade!
Mudaram muito a beleza e a inocência dos festejos juninos.
No mais, deixei tudo para os jovens (viciados).
Até que gostei bastante do texto nos registros saudosos.
Cuidado está Você a chegar aos sessenta...
Carlos Antonio Domingues
Companheiro Girley,
Dei uma olhada rápida, e deixei para dar continuidade posteriormente, uma vez que ainda estou atualizando meus compromissos na empresa, mas, “de cara” já tive oportunidade de ver a beleza que é o blog, bem como a gama de assuntos que nele são abordados, o que aliás não me surpreende em se tratando do amigo.
Fico honrado em saber que posso dispor de amizades de tão grande sabedoria.
Parabéns sinceros.
Abraços
Diogenes Andrade Filho
Oi GirleY,
Desculpe-me por só ter visto seu e-mail agora, é que meu e-mail estava novamente com problema. Mas adorei seu blog, e realmente não existe coisa melhor que brincar o São João no interior e visitar parentes e amigos nestas datas juninas, tudo parece ganhar um ar diferente de muita alegria e animação entre as pessoas, principalmente quando somos do interior. Eu também faço o mesmo e adoro todo esse clima de festas, forro e baião e arrastar pé no salão. Isso é bom DEMAISSSSSSSS.
Abraço,
SUELY ALVES
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