quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Irresponsabilidade Profissional

As eleições do domingo passado (02.10.22) como de se esperar provocaram, no antes e no depois das urnas apuradas, uma onda interminável de discussões e opiniões das mais diversas, divergentes e exacerbadas, típicas do Brasil dividido politicamente desde 2018. Surpresas não faltaram. Vencedores (e semivencedores) comemorando, derrotados em desespero e parte significativa da sociedade incrédula diante dos resultados. Incrédula, sobretudo, em face das discrepâncias grosseiras entre os números prognosticados pelos institutos de pesquisas e a realidade saída das urnas. Em 21 estados e no Distrito Federal muitas dessas discrepâncias foram conferidas. Indiscutivelmente, as pesquisas eleitorais que antecederam ao pleito deste ano revelaram um retrato de incompetência dos vários institutos que se prestaram a um autentico desserviço à sociedade. Digno, aliás, de revolta e desprezo geral. A rigor um crime social, se é que podemos considerar assim. Afinal, a sociedade tende sempre a se pautar por esses números que são levados a publico. Nada bateu certo e todos que se habilitaram estiveram bem distantes do que na realidade se confirmou na noite do domingo. No item das diferenças percentuais entre os dois principais candidatos à Presidência da República, então, foi uma verdadeira desmoralização. Enquanto o resultado proclamado pelo Tribunal Superior Eleitoral cravaram numa diferença de apenas 5,23 pontos percentuais, importantes institutos de pesquisas (Ipec/Globo, Datafolha, Ipespe, entre outros) haviam calculado diferença na casa dos 14%, com margens de segurança elevadas. Mais do que isso, chegaram a prever a vitória do ex-presidente Lula no primeiro turno. Vamos e venhamos foi uma baita surpresa porque afinal, e neste caso especifico, a diferença entre 5,23 e 14% é uma coisa fora de discussão. O candidato Lula com sua militância viu-se obrigado a abortar a festa da vitória armada na Avenida Paulista, em São Paulo. E aos pesquisadores coube a desventura amargar as ácidas criticas da sociedade e, se brincar, devem ter enterrado suas caras no massapê do brejo mais próximo que acharam.
Pessoalmente confiei em alguns números apontados e dei como certo um resultado que ao final não se confirmou e, pelo contrário, andou bem distante do que esperei. Desapontado recordei que, por força do meu oficio, pautei minha trajetória profissional realizando pesquisas sérias e estudos nelas baseados que até hoje alimentam uma crença inabalável no oficio de pesquisador. Ao longo dos anos perdi a conta das pesquisas para quais tive que estabelecer termos de referências técnicas, estudar a natureza do meio a ser pesquisado, checar as estratégias de segurança, operacionalizar o levantamento da base informacional e analisá-la devidamente. Tudo com responsabilidade profissional, para servir a uma sociedade que me remunerava para tanto. Desse modo confiei cegamente no que projetaram para essa eleição de domingo. Constatar, hoje, que esses institutos de pesquisas eleitorais podem ter atuado de modo irresponsável ou blefando contra uma sociedade carente de segurança se tornou para mim numa das mais cruéis das decepções. As pesquisas das eleições majoritárias – presidente da republica, por exemplo – foram as mais expostas e são as que mais estão em discussão. Pior, contudo, deve ter sido para candidatos a cargos legislativos que alimentaram ilusões de vitórias, baseados em pesquisadores irresponsáveis, quando no final amargaram derrotas. Pagaram pela incompetência de profissionais que visaram tão somente faturar, aproveitando a oportunidade apresentada pelo mercado. As desculpas que formulam estão longe de serem assimiladas e o estrago tende a se ampliara diante das iniciativas de processos judiciais que formalizam e, até mesmo, a instauração de uma CPI - Comissão Parlamentar de Inquérito, na Câmara Federal para apurar mais a fundo por onde passam os verdadeiros interesses, bem como identificando os interessados por tamanha atrocidade. No meu humilde entender, porque não sou especialista na área, foi um crime de lesa-pátria. De uma coisa estou certo: este nefasto imbróglio dificilmente será esquecido e esses irresponsáveis amargarão um profundo desprestígio no mercado de trabalho. Lembro que essa fase de pesquisas eleitorais tem seu tempo e sua ocasião. Fora esse momento de eleições os institutos de pesquisas ou os pesquisadores autônomos sobrevivem realizando pesquisas de outras naturezas, entre as quais as de opinião pública e as de mercado. Eu não teria coragem de encomendar uma pesquisa mercadológica das potencialidades do meu produto a um desses irresponsáveis. No lugar deles estaria revendo os valores profissionais da empresa e da minha equipe, as atitudes éticas e os instrumentais metodológicos. Só para começar. E para o Segundo Turno das eleições nem quero saber dos prognósticos. NOTA: Foto ilustrativa obtida no Google Imagens

8 comentários:

Ana Maria disse...

É estarrecedor ver como o nível de pesquisa no Brasil chegou ao ponto de descrédito. Não houve pesquisa de boca de urna para não mostrar o outro lado da moeda. Para mim estava tudo arranjado e orquestrado para o nove dedos.

José Paulo Cavalcanti disse...

Faltaram duas hipóteses, no seu generoso ( para os institutos ) comentários. 1. Receberam grana. Quanto? 2. Atuaram como ativistas políticos. Perdão, mas são as variáveis em que mais acredito. Abraços.

Nininha Brasileiro disse...

Amei você falou o que muitos de nós sentimos: pesquisas mentirosas.

Geraldo Pessoa disse...

Profunda e assertiva análise. Vou te copiar em relação ao segundo turno a distância. Estarei na casa de minha filha na Flórida. Alegre por está com a família e triste, porque o capitão vai perder dois votos .

Leonardo Sampaio disse...

Colocações perfeitas, prezado e brilhante irmão !

Leonardo sampaio disse...

Tremenda incompetencia e responsabilidade profissional, ética, moral e social.

Antonia Corinta de Lucena disse...

Girley, apreciei bastante o que li. Eu, tenho por norma geral não dar ouvidos às pesquisas. Razão pela qual, não me surpreendi, mas a maioria das pessoas, se deixam levar pelas pesquisas , daí a grande decepção.

Ina Mello disse...

Sobre o teu blog, fez-me lembrar do velho Arraes! Eleição só se ganha nas urnas! Até hoje nunca conheci ninguém que fosse entrevistado tanto no que diz respeito ao sendo demográfico como nas eleições! Agora não que a velhice me torna invisível, mas sempre convivi com
muita gente!

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