domingo, 23 de maio de 2021

Agredindo a História

Nos últimos dias um assunto tem dominando boa parte das rodas de conversas, presenciais ou virtuais, bem como manifestações publicadas na imprensa, de pessoas mais esclarecidas, contrárias a um estapafúrdio projeto de lei, da autoria de um pouco conhecido vereador do Recife, sugerindo a mudança de denominação da histórica e tradicional rua central do Recife – a Rua Nova – para Rua Augusto César. A ideia é de homenagear um cantor popular, recentemente falecido, que fazia ponto na referida artéria cantando e vendendo seus CDs, gravados amadoristicamente. Acredito haver sido um cara boa praça e de boa voz. Nunca ouvi falar antes. Tudo bem que se queira homenagear um tipo popular (dizem ter sido assim o homenageado) e sempre se encontrará uma razão. Contudo, nada mais absurdo do que os termos desta proposta sugerida que, no final das contas, agride as tradições e a cultura recifense, incluindo, creio eu, a dos próprios eleitores que colocaram o autor do projeto como representante no parlamento municipal. Eis aí mais um passo da insanidade que grassa neste país de Cabral cujo resultado tem sido apagar a História do país. A Rua Nova é historicamente palco dos mais importantes da evolução sociopolítica da cidade do Recife. Sua existência, sob esta denominação, data de priscas eras. Já existia em 1752 quando, segundo o jornalista Magno Martins (Jornal O Poder), por segurança, retiraram de lá a Casa da Pólvora da Provincia. Em 1870, mudaram seu nome para Rua Barão da Vitória (comemorando a vitória da Guerra do Paraguai) e que não colou. Entre outros fatos históricos, registra-se o assassinato de João Pessoa, governador da Paraíba, que precipitou a Revolução de 1930, ocorrido justo ali. Vide foto antiga, a seguir. Muitos outros episódios, que até poderiam provocar uma mudança, tiveram aquela rua como cenário, além de haver sido ao longo dos tempos a via mais elegante da cidade, contando com lojas de luxo, cafés e cinemas, num clima de grande metrópole. Mas, como tradição é tradição, nunca mudou. Vem agora essa idiotice, de quem parece não ter o que fazer, desejando mudar o nome de uma rua que resiste ao tempo e aos modismos de uma elite sem qualquer noção de história ou respeito às tradições culturais do burgo no qual atua, para perturbar a sociedade às voltas com outras preocupações mais sérias. Vereador, aceite um conselho: coloca tua viola no saco, arranja outra forma de homenagear teu cantor predileto e deixa a Rua Nova em paz. Lembra-te de que teu ídolo cantor poderia ser o primeiro a protestar.
A Câmara Municipal do Recife e suas congêneres no restante do País precisam criar comissões especiais encarregadas de inibir propostas absurdas e impatrióticas dessa natureza, coisa que tem sido recorrente no país, à revelia da sociedade que termina sendo apanhada de surpresas e sem possibilidades de reversão. Aqui no Recife esse tipo de desatino tem sido usado e abusado na tentativa de consagrar nomes que fizeram história no meio da sociedade local. Infelizmente, têm sido tentativas sem sucesso devido às escolhas das localizações, que nem sempre batem com a ideia e resistem às suas originais denominações. Exemplos disso lembro-me facilmente de alguns logradouros emblemáticos: à Avenida Norte acresceram o nome do Governador Miguel Arraes Alencar. Não colou. Continua sendo, para todos os efeitos, Avenida Norte. Ora, Dr. Arraes merecia algo mais honroso. Outro exemplo é o do Aeroporto dos Guararapes, ao qual foi agregado na sua denominação o nome de Gilberto Freire. Não surtiu o efeito projetado. Freire é um nome que merecia algo mais marcante. Por exemplo, um Centro Cultural. E, mais recentemente, o Diário Oficial do Município publicou a decisão do “fatiamento” da Avenida Beira Rio para homenagear três figuras, entre os quais Eduardo Campos. Dessa forma, um dos trechos passa a se denominar Avenida Beira Rio - Govenador Eduardo Campos. Fatiada como foi nunca deixará de ser Avenida Beira Rio. Vamos e venhamos, não é justo. A proposito de fatiamento lembro-me, agora, que moro numa rua relativamente longa que começa na Jaqueira, passa pelo Rosarinho e termina nos Aflitos com três nomes diferentes. Quem for do Recife sabe do estou falando. O último trecho, vejam só, é quase ridículo porque tem apenas cem metros e homenageia um certo Samuel Campelo. Cada trecho tem sua própria numeração. Não preciso dizer que quem busca meu endereço experimenta certa dificuldade porquanto imagina estar na minha rua e no meu numero, não estando. E para conclui, registro que fiquei sabendo que é corriqueiro os casos em que deshomenageiam-se antigos homenageados, para homenagear outros emergentes com grande frequência. É uma zona geral de parlamentares que precisam “retribuir” ou “garantir” vitória nas urnas eleitorais. A sociedade tem que participar e reagir a esses representantes de plantão que agridem a História.

13 comentários:

José Mário Galvão disse...

Muito boa matéria que nos faz refletir: quem manda permitir analfabetos serem eleitores? Dessa toca não sai coelhos, primo.
Mas tome cuidado em publicar sua ignorânciafobia e os ignorantes de plantão, por sentirem-se ofendidos, criarem o movimento pró AIP, associação dos ignorantes tem poder e te processar por ser intelectual fascista kkkkk.
É uma “sociedade” difícil.

Jorge Castro disse...

Então, viva a Rua Nova!!!!

Geraldo Magela Pessoa disse...

Parabéns Girlei, você é muito feliz na sua defesa a história e tradição. A rua NOVA
marca a lembrança de encontro com minha namorada em 1968 ,continuamos até hoje namorando .Recentemente foi reaberta à igreja Conceição dos Militares , que tem um marco importante em nossas vidasencontro a minha namorada , que continuamos na namorando até hoje e quando houver passado esta pandemia iremos revisitar nossa tradicional igreja com sua beleza ímpar

Vanja Nunes disse...


Precisamos ter urgentemente mais Girley
Bom dia

Luiz Augusto Figueiredo disse...

Cocordo plenamente. A história não pode ser desfigurada por interesses pessoais de quem quer que seja.

José Paulo Cavalcanti disse...

Parabéns, mestre. Assino em baixo, se permitir. Abraços.

Ina Melo disse...

Bom dia amigo li o teu blog de madrugada. Ontem o sono deu uma escapadela e foi passear na floresta! Realmente esses nossos vereadores não sabem nada de nada! Como poderiam conhecer a história da cidade! Sabes que os candidatos deveriam receber uma apostila sobre a cidade? Sugira no seu blog !

Lúcia Valença disse...

Li e achei o tema bem oportuno.
As vezes.algo nós incomoda e calamos.
Comungo com os argumentos.
Parabenizo.

Elizabeth Marinho disse...

Girley, você toda razão. As vezes fico pensando Porque tem tanta gente no mundo sem Noção das coisas mais simples quanto mais das coisas complexas???

George Araújo Alves disse...

Ilustre Girley, costumo ler as matérias de vossa autoria, aqui no grupo ou em eventuais visitas ao blog, ainda que sobre elas pouco comente ou quase nunca. Mas, em palestra que proferimos em fins do ano último passado ( malfadado 2020), alertamos para as estratégias sutis que são articuladas pelos simpatizantes de ideologias que não querem a preservação da nossa história. Agem com discretas ou quase impercetíveis intervenções a exemplo de uma mudança de nomes de ruas, porém, já planejando fazer inúmeras outras para que as gerações mais jovens, e até nós mesmos, percamos as referências de nossas bases e princípios, assim, ficamos mais frágeis em nos submetermos a futuras outras mudanças muito mais danosas para nossa sociedade.
São maneiras de, subliminarmente, nos impor novos conceitos e nos deixar "perdidos" a ponto de irmos admitindo como coisas "normais", ou sem relevância, enquanto avançam nos decálogos de destruição impostos pela NOM para sua agenda de domínio.
Um povo sem memória, sem princípios solidificados na própria história, é um povo alienado e de fácil manejo.
Por isso que em relação ao comentário feito em seguida por um atento apreciador do texto, este criticou o fato do "eleitor ignorante". Pois é, esse desinformado ou inatento eleitor já é uma vítima da política de domínio que a anos perdura em nossa cultura.
Um povo desinformado (ou mal informado) é muito sujeito a ser 'adestrado' do que uma sociedade educada e bem informada, portanto, considerando que nas últimas décadas, de fato, só tivemos a frente dos poderes constituídos, salvo rarissimas exceções, indivíduos que são anti-patriotas e que só pensam em seus escusos interesses, temos então esses frutos da ignorância e perpetuação de uma cultura de que "no Brasil as coisas são assim mesmo".
Prato cheio para aqueles que só interessam 'vender' o que ainda nos resta, e deixar nosso povo cada cez mais miserável em todos os aspectos. Lastimável, realidade.

Anderson Porto disse...

Excelente e oportuno texto.
Aqui em Caruaru tb sofremos deste mal, vereadores totalmente despreparados, com ideias estapafúrdias.

Durvalino Andreotti disse...

Pra quê serve vereador em Recife?

Ana Menezes disse...

Quando o patrão não gosta de empregado, dispensa-o . A mesma regra se aplica a vereadores. Extingamos desperdício de dinheiro público, empossando o Conselho Honorável de Cidadão sem remuneração, que funcionou muito bem anos atrás. Só temos a ganhar!

Haja Cravos

Neste recente 25 de abril lembrei-me demais das minhas andanças em Portugal. Recordo da minha primeira visita, no longínquo verão de 1969, ...