domingo, 12 de julho de 2020

Patrimônio Histórico

Rua do Bom Jesus, uma das mais bonitas do Mundo
Os pernambucanos festejaram com entusiasmo, nos dias recentes, o fato de haver sido a Rua do Bom Jesus, no Recife Antigo, eleita a terceira rua mais bonita do mundo, entre 31 listadas, segundo a última edição da norte-americana Architectural Digest. Clique em:  (http://www.architeturaldigest.com/gallery/most-beautiful-streets-in-the-world). Mais do que isto: foi a única rua brasileira incluída nesse rol. Naturalmente que se trata de uma escolha respeitável, resultante de um trabalho de equipe composta por profissionais abalizados e do ramo ligado às artes, patrimônio histórico e arquitetura. Não tenho dúvidas de que foi uma escolha acertada. Nossa rua, restaurada inteligentemente pelo Prefeito Jarbas Vasconcelos (década de 90) além de contar a história do Recife é um primor de preservação. Outras ruas brasileiras tão bonitas quanto a nossa Bom Jesus estão espalhadas pelo país. Mas, em tempos que grassam mentes atendando contra os patrimônios históricos temos, então, um motivo oportuno de comemoração. Entendo, por outro lado, que outras ruas brasileiras e estrangeiras estão habilitadas à inclusão numa lista desse gênero, mas, como a nossa foi notada, festejemos pois.
A propósito do tema, confesso que sinto pontadas de revolta quando vejo iniciativas de demolição, reformas e “modernização” de prédios seculares pelo Brasil afora. Raros são casos de restauração que é sempre desejado. E é bem mais comum do que se pensa. Aqui em Pernambuco acontece frequentemente. Ali mesmo, próximo a rua do Bom Jesus, no Marco Zero da cidade, existe um prédio, pertencente a um grande Grupo Empresarial, que foi “modernizado” e descaracterizado de modo estúpido quebrando a harmonia neoclássica da grande Praça. Era de beleza pouco comum e se transformou num monstrengo envidraçado que choca o cenário histórico. Aliás, a própria Praça do Marco Zero foi “modernizada” na passagem do século passado que, a meu ver, foi outro erro imperdoável. No mesmo bairro, outro prédio foi “enjaulado” numa barreira de cobogós na cor brick no intuito de esconder as linhas arquitetônicas originais. Seus proprietários quiseram dar o toque de modernidade. Resultou noutro monstrengo. Esse porém foi corrigido pelo Instituto do Patrimônio Histórico do Estado, que numa sábia decisão determinou a retirada dos cobogós e o prédio ressurgiu com sua antiga beleza. Lamentavelmente, no interior do Brasil loucas ideias surgem, também, com frequência. Casas e sobrados seculares são muitas vezes “remodeladas” e ressurgem com fachadas horrendas, quase sempre em azulejos ou peças de cerâmica de gostos duvidosos, em substituição aos traçados originais sempre mais elaborados. Os proprietários ignaros se enchem de orgulho com esses feitos, quase sempre à revelia dos administradores públicos e profissionais competentes.
Prédio modernizado, a esquerda da foto, destoando do cenário do Marco Zero do Recife.
Curioso é que, infelizmente, não se trata de um desvio de visão histórica reservada aos brasileiros. É uma coisa que se reproduz no mundo inteiro. Mesmo na Europa, onde há um especial cuidado com o patrimônio histórico, registram-se casos dessa infeliz natureza. Um exemplo recentíssimo de desprezo à preservação do patrimônio histórico foi o que tomei conhecimento lendo matéria assinada por Jon Henley, correspondente do Jornal The Guardian (Londres) na edição de Sexta-Feira passada (10.07.20). Refiro-me a  uma discussão acirrada que tomou conta das autoridades e sociedade francesas quanto à restauração da torre e do teto da Catedral de Notre Dame, consumida por um brutal incêndio, no dia 15 de Abril do ano passado. Imaginem que o próprio Presidente francês, Emmanuel Macrón, teve a infeliz coragem de sugerir uma mudança radical no formato da torre e do teto do templo. Com traços modernosos! 
Esboço da infeliz ideia de Macrón para a Notre Dame.
A ideia era construir uma torre, em vidro, incluindo um jardim suspenso. E acrescentou: “vamos reconstruir a Notre Dame mais bela que antes”. Ora, meu Deus, trata-se de uma construção icônica, símbolo de Paris, construída no Século 12! Interpretei como sendo um surto de vaidade e ignorância. Penso que desejou entrar na História como um modernizador. Com todo respeito, como qualificar tamanha burrice?
Outra imagem do sonho de Macrón
Obviamente que gerou um duro debate envolvendo historiadores, arquitetos e especialistas, à frente Philippe Villeneuve, chefe da Comissão de Arquitetura e Patrimônio Nacional Francês. Caíram em cima do vaidoso presidente e derrubaram a monstruosa ideia. Para alivio dos que preservam o patrimônio histórico, o traçado original será mantido. Bom saber que existe verba – pública e de doações – para tocar o projeto que deve ser entregue em 2024, quando dos Jogos Olímpicos de Paris.
 Encerro lembrando que quem não preserva sua História vive sem identidade.. 

Notas: As fotos do Recife foram obtidas no Google Imagens e as fotos da Notre Dame de Paris são reproduções das que ilustraram a reportagem do The Guardian (Edição Eletrônica) de 10/07/2020.         

8 comentários:

José Paulo Cavalcanti disse...

Assino em baixo. Depois conto de um projeto, para dar fim àquele monstrengo de vidro no Marco 0. Você vai achar graça. Abraços.

Ranulfo Cunha Filho disse...

Que horror a ideia do presidente da França, tinha que ser ele mesmo 😡.

Flávio Tavares de Lyra disse...

Excelente notícia! Parabéns pelo oportuno e bem elaborado texto.

José Otávio Carvalho disse...

Amigo Girley. Você é um esteta.

Glay Brasileiro disse...

Parabéns Girley! Muito oportuna sua colocação! Até hoje não entendo, pq a "Ponte Giratória", foi burramente substituída por um monstrengo de concreto, e tantos outros absurdos cometidos, por tantos gestores públicos idiotas. Povo que não preserva seu passado, não tem futuro.

Cristina Carvalho disse...

Bom dia, companheiro Girley!!! Concordo que não somos um povo especialmente preocupado com sua história e tb fico feliz com a premiação da Rua do Bom Jesus.
No momento, me preocupa a situação do Americano Batista. Mas, espero que os prédios sejam preservados ��para que a história daquele Educandário não se perca.

Valdelirio Soares disse...

Preciso conhecer e viver melhor o Recife.

Iêda Almeida. disse...

Achei maravilhoso!
O Recife antigo e a Rua do Bom Jesus , são lindos...
Mais bonito ainda... na época do Governador Jarbas. As pessoas se arrumavam para passear na Bom Jesus, seus bares e restaurantes, sempre lotados. Era um novo Recife, que mataram.
Uma pena!
Que saudade!

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