quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Inteligências Perdidas


São muitos os prejuízos decorrentes da atual crise na qual o Brasil está mergulhado. Inútil enumerá-los porque são bem sabidos e vivenciados por todos. Todos, mesmo. Um desses prejuízos, contudo, tem sido relativamente pouco visualizado. Refiro-me à desilusão que atinge os jovens integrantes da força de trabalho que chega ao mercado, a cada ano. O crescimento vegetativo da população vem crescendo, segundo o IBGE, a uma media anual de 1,24%. É uma taxa significativa e, obviamente, o crescimento da população entre 18 e 30 anos não para aumentar. Enquanto isto, as oportunidades de engajamento no mercado de trabalho estão escassas ou quase nulas, em certos segmentos. Um desespero para quem investiu duramente numa formação profissional e cai nesse ambiente hostil, no qual se fala mais de desligamentos do que de admissões.
Resultado disso tudo é que os que fazem parte dessa parcela da sociedade estão sendo empurrados para um limbo (entendo que se trata de um lugar marginal, sem luz e sem futuro certo), no dizer do cientista Ricardo Henriques (Economista do Instituto Unibanco) em entrevista ao jornal Valor Econômico de 16.08.17. Nesse limbo perambulam tateando em busca de uma solução de sobrevivência e organização do futuro. É, portanto, uma geração prejudicada cuja perspectiva é de um tempo de dificuldades ilimitadas.
Sem soluções econômicas imediatas, esses jovens em desespero, se lançam quando bem “sucedidos” em atividades informais,  geralmente muito diferente da formação acadêmica  que tiveram e sem as garantias que a formalidade lhe assegura. Alguns vencem. Outros se perdem no meio do caminho. Serão brasileiros frustrados nos seus projetos de vida e integrantes do já grande contingente de cidadãos revoltados com a instabilidade do país. 
Ela estudou muito, mas, caiu no mercado informal.
Há também os que fogem para outros países, onde esperam iniciar uma vida mais digna e produtiva. Naturalmente que essas fugas não são nada fáceis haja vistas para aqueles que escolhem, por exemplo, os Estados Unidos – que exerce um poder de atração fantástico – e se lançam em aventuras arriscadas, inclusive a da entrada clandestina, via México, pelas mãos dos chamados coyotes. Muitos perdem a vida na travessia.
Outra parcela desses jovens, aqueles com melhores condições econômicas, se aventuram de forma honesta, dão adeus ao Brasil e se organizam noutros países onde passam a viver com mais tranqüilidade, segurança e dignidade, ainda que na maioria dos casos sem exercer a profissão para a qual se preparou. São jovens inteligentes, com capacidade de por mãos à obra e que poderiam empreender no país de origem, mas, não encontram ambiente propício. As políticas de promoção do empreendedorismo na sua grande maioria não passam de retórica. E quando dão sinais de viabilidade, esbarram nas dificuldades do famigerado Custo Brasil. Faltam financiamentos, subsídios, juros civilizados, carga fiscal digna e bem aplicada, capacitações  específicas, segurança jurídica, infra-estrutura, entre outros itens. Falta quase tudo! Nem a vontade resta! Isso sem esquecer que a cultura da corrupção reinante se constitui num pano de fundo desta onda de desilusão.
Tenho tido oportunidade de ver muitos jovens arrumando as malas e se despedindo para sempre. Jovens com formações superiores e revoltadas por ter que partir para construir uma nova vida, abandonando família, amigos e a boa vida de Pindorama.
Dois países se destacam como destinos mais procurados: Austrália e Canadá. Este faz com alguma freqüência promoção de boa vida e empregos abundantes, aqui no Brasil. Aqui no Recife, inclusive. São levas de brasileiros por lá. Conheço alguns.
Já na Austrália, por onde ando vez por outra, encontro muitos jovens brasileiros trabalhando em bares, restaurantes, parques, entre outros locais, felizes por estarem distantes desses imbróglios político-sociais brasileiros, da insegurança, dos baixos salários, do desrespeito ao trabalhador e das inúmeras outras desvantagens corriqueiras no dia-a-dia por aqui. Jovens advogados, administradores e engenheiros brasileiros preferem servir em restaurantes e bares australianos, sendo bem pagos por hora, do que receber salários miseráveis no mercado brasileiro. 

Esta semana, por exemplo, fiquei pasmo com a definição, pela OAB, do piso salarial de um advogado aqui no Brasil, que é de R$ 2,0 mil. É quanto se paga a um desses jovens, quando empregado numa banca bem estruturada. Isto se quiser! Caso contrário, vá bater noutra porta ou mude de ofício. Ou então vai ser garçom em Sydney, Melbourne ou Perth.
A grande maioria vai e não deseja voltar. Vão ficando, se radicando e pronto! Quanta inteligência perdida. Quanta insensatez desses nossos governantes.

NOTA: Ilustrações obtidas no Google Imagens.
  

3 comentários:

Ina Melo disse...

Como sempre, excelente o texto.
Ina Melo

J.Artur disse...

Permita-me salientar que Vosmecê deixou de considerar os que "se formam em política" e vão ganhar milhões apenas assinando o ponto. Esses jamais sairão da Terra Brasilis... Parabéns por mais um texto lúcido e enxuto.

JR Produções disse...

Parabéns Girley, enorme percepção do real problema Brasileiro, vale enfatizar que os R$2.000,00 como salário base do advogado em Pernambuco agora é lei estadual, mas mesmo assim ainda haverá os "jeitinhos", além de ficar bem aquém do que se possa dizer "digno"

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