terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Competitividade declinante

Semana passada, participei, em São Paulo, do 5°. Encontro Nacional da Indústria – ENAI, promovido anualmente pela Confederação Nacional da Indústria – CNI e tido como sendo o maior evento da classe empresarial do setor industrial brasileiro. O tema central, desta vez, foi competitividade. Oportuno e, ao mesmo tempo, preocupante. Durante dois dias os empresários viram-se às voltas em discutir a questão que, há uma década e pouca, ronda as cabeças dos que lidam no setor.
O problema está, há tempos, diagnosticado. Conhecido e discutido. Agora, porém, pende para um plano muito mais delicado, na medida em que o vocábulo desindustrialização passa, com freqüência notável, a fazer parte dos discursos e debates. Pelo visto e do jeito que a coisa vai, o Brasil tende ao desmonte da sua indústria em face dos gargalos impostos pela equivocada ou tênue – bancando um elegante – política de desenvolvimento econômico nacional e a falta de decisão para proceder as reformas estruturais tão esperadas: tributária, previdenciária e politica.
A supervalorização do Real, facilitando a entrada dos importados, a estúpida política tributária, os juros estratosféricos, a infra-estrutura sucateada, a defasagem tecnológica, a falta de mão de obra qualificada, os ineficientes programas de educação e preparação de recursos humanos, entre muito outros em cadeia. Um desespero. Como pode um país com tantas potencialidades, tantas riquezas naturais, um povo cheio de criatividade e inteligência despencar de forma acelerada e conviver com o fantasma da desindustrialização?
Mesmo em São Paulo, mola propulsora do desenvolvimento nacional, já se fala, por exemplo, na falência dos esquemas de logística. Há gargalos diários nos movimentos de cargas, in e out, provocando prejuízos perfeitamente evitados noutras partes do mundo globalizado. Inadmissíveis os engarrafamentos urbanos ou os monstruosos nas rodovias, cargas e descargas impensavelmente demoradas, devido à mão de obra desqualificada e aos equipamentos obsoletos, falta de profissionalismo e responsabilidade dos operadores... Um horror! Atualmente, parece que as coisas se agravam em progressão geométrica. E, vejam que estou falando de São Paulo. E falo pelo que conferi in loco: em setembro fiquei duas horas e meia num engarrafamento no Anel Viário, no sentido Baixada Santista (Porto de Santos), ao volante de um automóvel, sufocado entre imensas e centenas de carretas de carga e uma pancada de outros veículos de passeio. Motivo? Excesso de veículos. Imagine que o referido Anel foi construído para solucionar os congestionamentos e tirar o trânsito de carga pesada da cidade, facilitando o alcance de pontos economicamente importante. Quem sabe, outro anel deve ser pensado. Agora mesmo, na sexta-feira passada (dia 3 de dezembro), vi um engarrafamento descomunal de, segundo a radio sintonizada, 46 quilômetros, na rodovia dos Bandeirantes, sentido interior-capital, em decorrência do atropelamento fatal de um cidadão que trafegava numa motocicleta, as seis da manhã, na marginal do Tietê, entrada da cidade. Morreu no local e o corpo só foi levantado cinco horas depois. Foi tempo suficiente, é claro, para desorganizar o trânsito de chegada à capital paulista, naquela manhã. Faltou competência e responsabilidade da policia de transito e das autoridades de pronto socorro. Em qualquer país civilizado esse problema receberia atenção prioritária e o corpo, após constatação do óbito, seria guindado de helicóptero ou veiculo em uma fire lane (via expressa para servir em casos dessa natureza). Pobre Brasil. E mais pobre ainda fora da locomotiva São Paulo. Faça-se idéia do ocorre noutros estados mais pobres. Como ser competitivo?

Voltando ao Recife, dirigi-me ao aeroporto de Cumbica para pegar um coletivo da Gol/Varig. A estação de passageiros era um pandemônio de gente tentando embarcar. Vôos cancelados, chuvas pesadas, over-books a “dar no pau”, avião atrasado, poltronas apertadas, uma zorra total, em plena noite do domingo. Impotente, restou-me esperar, entregando ao Bom Deus.
A pior, gente, é que o leigo, isto é, a grande maioria, só faz perguntar como será em dias de Copa do Mundo e Olimpíadas, como se isto fosse o mais importante e estrutural. Tem importancia e será um estimulo, é verdade. Mas, será tudo?
Mais incrível, ainda, é que o Governo cacareja, sem parar, sucesso e progresso e os “manés” engolem a corda. Inocentes, coitados. Com pouco, podem chorar pelo fechamento em massa das fábricas e desempregados na rua da amargura. Mês passado, a Philips Eletrônica, em Pernambuco, fechou de vez e passa a trazer da China o que produzia no Recife, com preços 25% mais baratos. 400 desempregados! É a desindustrialização... ou não é? É a falta de competitividade, minha gente. O ENAI cumpriu sua parte, “botando a boca no trombone”. Falta o Governo fazer a dele.

NOTA: Fotos obtidas no Google Imagens

8 comentários:

Mauro Gomes disse...

O pior de tudo, meu amigo, é que não vemos luz no fim do túnel.

Mauro Gomes

Corumbá disse...

Caro Girley:

Sem tirar nem por é o que venho falando há algum tempo. Vejo-o agora escrito por você de forma direta e brilhante.Permita-me coassinar abaixo.
Muito obrigado!
Corumbá

Baiano da Nigeria disse...

Prezado Girley,
Nada mais inspirativo que a leitura de suas colunas. Francamente, o Brasil seria outro se mentes brilhantes como a sua estivesse nas posições de mando do governo desse país.
Inspirativo pois lembrou-me de um tema que venho escrevendo e falando ha muito tempo, especialmente, durante meus anos em sala de aula.
É verdade que os problemas brasileiros estão diagnosticados ha muito tempo. No entanto, a solução para mim está sendo adiada ha décadas por uma visão míope do que vem a ser nacionalismo e soberania. Essa interpretação dominante de Brasil potencia, de assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, e de o país hoje ser credor do FMI e, acima de tudo, ter O Cara no comando da nação, levaram o Brasil a uma situação de isolacionismo estratégico.
O que quero dizer com isso? Simples, o Brasil não participa de nenhum mega-bloco econômico do mundo, não tem acordos bilaterais com nenhuma grande potencia economica e tratou de matar a ALCA com um discurso não apenas míope, mas totalmente cego.
Ora, isso tem atrasado o acesso a mercados importantes que poderiam estar mais abertos a Brasil. Veja que visão torpe! Primeiro, torceram pela eleição do Presidente Barrack Obana para, depois, voltarem à banca do anti-americanismo chavista, esquecendo que um acordo bilateral com o Tio Sam poderia encerrar a necessidade vistos para os cidadãos dos dois paises, atrair investimentos permanentes, e extinguir barreiras, levando, quem sabe, o Brasil a ser convidado a integrar uma expansão do NAFTA. Porem, o argumento é que o Mexico fez isso e virou reduto de traficantes.
Argumento ridículo. Basta olhar para o que aconteceu no Rio para se ter ideia que uma coisa nada tem a ver com a outra.
Assim, meu amigo, torço para que voce não demore muito em voltar a postar seus artigos. Quem sabe eles se transformem numa corrente que leve o proximo governo a visualisar uma nova realidade para nosso Brasil. Sonhar é sempre o primeiro passo para se mudar a realidade.
Abraços,
Baiano da Nigeria

Viaggio Mondo - assessoria comunicação disse...

Olá, Girley!

Seu blog é muito bom, adorei!

Quero aproveitar para te convidar a conhecer meu blog também e participar da Promoção 1001 Seguidores. Como prêmio você pode levar para casa uma das agendas 2011 recheadas de fotos dos mais de 40 países que visitei! Se quiser, traga também seus amigos e leitores! :D

Aguardo você! :)

Bjos!

Tereza Viana Gadelha disse...

Girley
Você diagnosticou a realidade brasileira como ela é.
O melhor amigo é aquele que diz a verdade,
mostrando que a mudança deve ser feita urgentemente.
Tereza Viana Gadêlha

Geraldo Casado disse...

MEU CARO GIRLEY, LEIO COM SATISFAÇÃO O SEU BLOG.- IMAGINO,PELO O QUE TENHO SOFRIDO EM RECIFE, QUANTO VOCÊ SOFREU EM SÃO PAULO.- É DE LASCAR.- É PRECISO GENTE COMPETENTE PARA DISCIPLINAR O TANSITO.- CONTINUO ESPERANDO.- O ABRAÇO DE SEMPRE.- GERALDO CASADO.-

Celso Cavalcanti disse...

Caro Girley,
A culpa pela Infraero fazer cara de paisagem em relação a estes descalabros, é nossa. Nos contentamos em simplesmente embarcar, a despeito dos atrasos, desconforto, etc, e deixamos para os outros a tarefa de exigir a contrapartida pelas nossas taxas de embarque.
O público que vem para a Copa e Olimpíadas tem outras expectativas de atendimento. Se nada fôr feito com urgência, além de passarmos vergonha vamos desperdiçar uma chance histórica de consolidar o Brasil como efetivo destino turístico mundial.
Quanto a esta suposta "desindustrialização" é importante ficarmos atentos ao que pode estar por detrás desta campanha. Quem está liderando esta "lavagem cerebral" são alguns setores oligopolizados que sempre contaram com a proteção do Estado contra a concorrência global. Isto pode até ter sido válido por algum tempo mas agora, pode se tornar danoso para nós contribuintes e para o restante da cadeia produtiva que depende destes insumos.
Este foco difuso na apreciação cambial termina servindo de cortina de fumaça contra a discussão de outros fatores relevantes, a exemplo do ineficiente e inadequado sistema tributário interno, burocracia estatal paquidérmica e colapso logístico, além do puro e natural desejo de maximar margens.
A título de instigação e utilizando um exemplo bem próximo de nós, pergunto, o que é correto e melhor para Pernambuco:
1) importar chapas de aço de quem tem preço e qualidade, viabilizando assim o nosso recém-nascido pólo naval através da satisfação das exigências de custo e qualidade dos clientes que encomendam navios e que podem fazê-lo em qualquer estaleiro do mundo;
2) conformar-se em pagar mais caro no mercado nacional por este insumo básico, perdendo as concorrências para os estaleiros coreanos, chineses, sul-coreanos, etc;
3) continuar afretando ou comprando navios estrangeiros, remetendo divisas e mantendo uma vulnerabilidade externa perigosa?
Como pode-se ver, a discussão não é tão simplória como "alguéns" querem nos fazer acreditar.
Um abraço, Celso Cavalcanti

Danyelle Monteiro disse...

Boa tarde professor,
Bem, o tema é polêmico. Há que se prestar atenção na produção da indústria de transformação brasileira, que saiu de 20% em 1947 para 36% em 1985 e algo em torno de 16% do PIB em 2008, no entanto, não podemos esquecer que em 1990 e 1995, houve mudanças de metodologia no cálculo do PIB e que uma correção dessas quedas sugere que foram menores. Além disso, nos anos de 1970 e 1980, certamente devido à política de substituição de importações, o Brasil tornou-se sobre-industrializado e a partir da década de 1990, houve um suposto retorno a normalidade e apesar dos nº apresentados por pesquisas oficiais como a PIA (IBGE) apontar crescimento no emprego industrial entre 1996 e 2008, temos sim que nos preocupar e muito com a China, pois com a retração do consumo nos países ricos, a mesma tende a voltar suas exportações para os países emergentes como o Brasil e concorrer de forma desigual com seus produtos, pois praticam o dumping de mercado, pagam baixos salários, mantém o Yuan artificialmente desvalorizado... então na hora de pensarem em exportar isso ou aquilo para a China, o cálculo tem que levar em consideração a perda de milhões de postos de trabalho decorrentes das exportações de manufaturados dos mesmos. Sugiro que a solução venha através de acordos entre diversos países exportadores e importadores da China, de modo a forçá-la a se enquadrar nas condições dos outros países, sem mexer no câmbio, arcando com os encargos trabalhistas.
Danyelle Monteiro

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