quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

SUDENE: Minha Escola

No dia 15 passado completaram-se 55 anos de criação da SUDENE. Participei de um almoço com companheiros da chamada velha guarda da Autarquia reunida para lembrar o fato.  Muitas cabeças pensantes, de uma época de ouro do Planejamento Regional, compareceram para rememorar seus feitos e “trocar figurinhas” avaliando os resultados que hoje são exibidos.
Sai desse almoço contente por haver confraternizado com velhos companheiros de labuta e, ao mesmo tempo, lamentando o atual estado da arte que construímos a duros sacrifícios, em tempos politicamente difíceis e de poucos fios para recompor um tecido sociopolítico esgarçado.
Entrei na SUDENE muito jovem. Recém havia chegado aos meus dezoito anos de idade. Sequer havia prestado vestibular à Universidade. Na minha casa a lei era dura e prevalecia a sabedoria popular que ditava: “quem não trabalha não come!” Tive sorte. Levado pelas mãos de um alto funcionário da Autarquia fui admitido – após uma fase de capacitação e avaliação – como técnico de nível médio. Comecei como desenhista num departamento que tratava de definir e traçar a infraestrutura rodoviária regional. Fiz treinamento, vejam só, até no exterior para melhor exercer minha função. Naquela época, minha intenção era seguir a carreira de Arquiteto, por isso que ser desenhista parecia ser o ideal. Contudo, influenciado fortemente pelo ambiente que passei a vivenciar, terminei me interessando pelos temas relativos aos problemas econômicos regionais. Não deu outra... fiz vestibular de Ciências Econômicas, sai-me muito bem e pouco tempo depois virei Economista da SUDENE. O resto dessa história é sabida sobretudo pelos  que me conhecem.
Vi a SUDENE crescer, produzir bons resultados e se projetar no Brasil e no resto mundo como sendo uma das mais competentes agencias de desenvolvimento regional daqueles tempos. Participar ativamente dessa experiência foi cursar o melhor dos cursos. Lá, aprendi tudo que as Universidades por onde passei não me ensinaram. Décadas depois, vi também o fim melancólico que ocorreu em 2001, quando já me encontrava aposentado.
Olhando pelo retrovisor, vejo com clareza que a SUDENE dos meus tempos – não esse arremedo que aí está tentando sobreviver – se constituiu, durante 40 a 45 anos, na maior escola da formação de profissionais diferenciados e dedicados, com afinco, à promoção do desenvolvimento socioeconômico regional deste País. Inúmeros foram os valores que de lá saíram para contribuir com o sucesso de intervenções governamentais em outras  áreas deprimidas do Brasil e do exterior.
Ao longo dos tempos a sigla SUDENE se tornou uma senha para o sucesso. Tenho muito orgulho de haver usufruído desse sucesso. Dentro do Brasil ou nos vários países por onde passei, em missões técnicas ou empresariais, esta senha abriu-me as melhores portas. Pensando bem, ainda abre! Hoje, porém, tenho que reconhecer que tudo isso é passado. Fecharam a Escola. Mas, afinal, a missão foi ou não cumprida? Disparidades inter-regionais persistem neste país? E as intra? Eis aí uma formidável questão a ser explorada.
Bom, indiscutivelmente, tudo neste mundo é finito. E, pelo visto, foi assim que julgaram ser a SUDENE. Por uma vontade política discutível, em 2001,deram por encerrados os trabalhos. Portas fechadas e pessoal redistribuído, a Casa da Inteligência Regional deixou de existir. Fala-se que seu acervo documental tem sido gradativamente destruído, num perverso apagar de memórias técnicas que somente num país como o nosso é permitido. Até o monumental edifício sede - propriedade da Autarquia - perdeu os letreiros garbosos e, ao invés disso, colocaram o do Tribunal Regional do Trabalho que ocupa a área antes sede da SUDENE.
Depois, num gesto “generoso” e de cunho meramente político Lula, o Presidente, reabriu a Sudene, em dimensões minimizadas, através da Lei Complementar 125/2007. O que lá existe é um pretenso modelo de agencia de desenvolvimento, onde funciona, tão somente, o núcleo burocrático de programas sem os alcances do passado e destinados a calar uma resistência teimosa de alguns idealistas na incansável luta pelo resgate do status do passado. A pergunta que não cala é: foi certa a decisão política de fechar a SUDENE?
Pelo mesmo espelho retrovisor de antes, lembro-me de uma das minhas passagens por Paris, ocasião em que me encontrei com o perito das Nações Unidas, o francês Jean Pierre Barriou. Ele havia estado, pouco antes, em missão oficial aqui na SUDENE. Barriou me garantiu que sugeriu uma SUDENE revendo sua missão. Muitas das funções que “penduraram”, ao longo dos anos, na estrutura da Agencia não se coadunavam com a missão que lhe fora confiada originalmente. Urgia reduzir aquele gigantesco organograma e, com isso, reduzir seu quadro de 2.200 funcionários, para algo próximo de 200. Essa proposta não agradando aos da Casa foi “esquecida”. Quando decretaram o fim, em 2001, lembrei-me dessa conversa. Mas, atenção, o formato dessa atual SUDENE não foi o sugerido por Barriou. Paciência!
Tentando ser realista e para finalizar, considero que, na esteira do seu sucesso, a SUDENE estruturou os estados do Nordeste de forma competente para que estes tomassem um rumo virtuoso do desenvolvimento econômico, social e político. Nada mais inclusivo do que essa estratégia! Digamos que os provendo de “asas”, como se filhotes fossem, ensinou-os a voar. E voaram. Os esforços conjuntos, traduzidos pela figura de um Conselho Deliberativo atuante e politicamente forte, deram lugar às iniciativas independentes. Descobriram o caminho direto para o Planalto Central e, desse modo, perguntavam: para que SUDENE?   
Não me julgo saudosista, porém, lamento porque fecharam a minha Escola.

NOTA: Foto obtida no Google Imagens 


                  


Um comentário:

Aristophanes disse...

Prezado Girley.
Conferindo a data de sua postagem, 18/12/2014, há 10 dias, julguei que, pelo título sugestivo, já fosse encontrar uma boa quantidade de comentários. Fiquei surpreso com o aviso de “nenhum comentário”. Veja como, além de morta, a SUDENE está esquecida!
Isso me fez lembrar uma frase que meu pai mandou gravar na sua tumba, lá na Paraíba: “Nossos mortos estarão verdadeiramente mortos, quando saÌrem da memória dos que estão vivos” .
Digo isso porque a SUDENE que está aí, sucessora de uma esdrúxula Adene e, demagógica e pretensamente, ressuscitada por uma “abraço” do Lula, não é uma SUDENE rediviva. É um clone mal feito da finada.
Como Você sabe, estive, com alegria, no almoço acima comentado. Não sou um “puro sangue” como Você. Cheguei à antiga SUDENE, em 1962, com 31 anos, emprestado pelo Banco do Brasil, a quem já servira por 10 anos, e portando um recém conquistado diploma de Engenheiro Civil. Do Rio de Janeiro, me trouxe o amigo e conterrâneo Juarez Farias, falando coisas lindas sobre exército de TDE’s de Celso Furtado e o maravilhoso novo tempo que se desenhava para o Nordeste.
Acreditei e dediquei o melhor do meu modesto conhecimento e do meu maior esforço, apaixonado pelo grande projeto técnico-político de Celso: acalentado pelo estadista JK e, por algum tempo, suportado pela amálgama política dos Governadores nordestinos – pragmáticos, interesseiros e atraídos pelo força dos planos diretores e dos recursos da, então, poderosa agência de desenvolvimento regional.
O sonho durou pouco! Parece ironia, mas duas grandes forças, que ajudaram a enfraquecer o projeto original da SUDENE, foram gestadas na própria SUDENE: Uma, o planejamento central, de que Celso Furtado foi criador, como o primeiro ministro do planejamento, no governo(efêmero) parlamentarista de João Goulart(1963). Outra, foi o aprendizado dos Estados, que descobriram os próprios caminhos de seus planejamentos e de suas buscas, como Você bem historiou. A terceira e poderosa força resulta da ausência de um sentimento nacional de integração e de busca permanente dos equilíbrios entre os desiguais.
Faço questão de me dizer paraibano, pois o estado é um ente federativo, com claro perfil geo-político e constitucionalmente definido. Diferentemente, não aceito o título de “nordestino”. Que nordeste?! O da SUDENE, do IBGE, do Polígono das Secas, do Bolsa Família???. Eu sou BRASILEIRO, da Paraíba!
Abraço do colega Aristophanes Pereira

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