O tempo correu e na sua rapidez transformou a bonequinha
numa mulher bela, viçosa e cheia de charme. A cada ida à Fazenda Nova, onde ela
vivia com meus avós e irmãos, eu percebia a transformação, ao encontrá-la adulta
e assegurando-me ser ela feita de carne e osso. A boneca cresceu! Virou uma diva,
mulher e formosa e arrancava suspiros de paixão dos marmanjos que a esperavam
passar e desmontava de inveja as donzelas que a avistava.
Cheia de graça e dengosa movimentava a pacata Vila de
Fazenda Nova, que à época era o point
da burguesia recifense, em busca de fazer a estação d´água, na estância
hidro-mineral local. No Hotel Familiar – propriedade do pai, meu avô, Seu
Nondas – na alta estação (mês de julho) o ambiente noturno era de festas promovidas
pela diva Diva. Uma verdadeira locomotiva...
O tempo não esperou e trouxe, de repente, o gaúcho Plínio
Pacheco que, a despeite da oposição cerrada de alguns familiares, pelo fato de
ser um cidadão desquitado, ousou e “roubou” a diva Diva, transformando-a em sua
esposa, com a qual teve quatro filhos.
O casamento, num contexto familiar tumultuado, transformou a
bonequinha de porcelana numa mulher valente e aguerrida, desde os modos de ser
e se impor, aos de vencer na vida. Embarcou, junto com Plínio, numa das mais
fascinantes das aventuras dos nossos tempos, que foi a de construir uma cidade-teatro
para abrigar o espetáculo da Paixão de Cristo, criado anteriormente pelo velho
Epaminondas Mendonça, pai da diva Diva.
Ao longo dos anos conclui que a bonequinha-mulher construiu
uma vida forjada com suor, sangue, lágrimas e muitas pedras. O resultado está
lá, no meio do semi-árido, que é considerado o maior teatro ao ar livre do
mundo: Nova Jerusalém. Plínio assumiu a construção, mas, sem dúvidas, ela foi a
alma do negócio.
Com tanto suor, sangue e muito granito a bonequinha perdeu,
aos poucos, o viço e a cútis de porcelana, passando a revelar – de modo
prematuro – as marcas impostas pelo tempo, esse patife que não nos deixa
escapar das suas garras.
Sem suportar as falhas de um corpo já debilitado e padecendo
de uma enfermidade irremediável a diva Diva se encantou, na semana passada, indo
fazer teatro e levar muita alegria ao Céu. Tenho a certeza de que São Pedro fez
a maior festa para recebê-la. Por outro lado, acho que Nossa Senhora estava
logo adiante para, cheia de curiosidade, conferir as vestimentas que ela
escolheu para sua viagem sem volta. Partiu vestida de Maria, mãe do Nazareno,
como tantas vezes fez para representar no teatro que ela mesma construiu.
Restam, agora, as lembranças e a saudade de uma mulher
valente nas suas atitudes, sabendo o queria na vida terrena, carinhosa com seus
familiares, mãe e avó extremosa, generosa com os desamparados e, claro, tia
querida. Não esquecerei nossos momentos de carinhos e amizade, nossas desavenças – sim, elas
existiram também – tudo de forma indelével.
Baixem o pano! O drama da diva terminou! Aplausos!
Nota: Fotos obtidas no Google Imagens
9 comentários:
Uma boa lembrança. Uma justa recordação. Uma homenagem. Sempre menor que a meritoria.
Parabens
A vida é assim mesmo, caro amigo Girley, o maior dos espetáculos. No teatro da vida sua cortina se abre e fecha uma única vez. Abre-se com alegria e logo se fecha com a tristeza da morte. E assim nascemos chorando como profetas de nós mesmos. Nossos sentimentos - Assis/Telma
Que palavras vou dizer? Você disse tudo meu caro Girley. Parabens.
Olá Girley.Divulguei no FACEBOOK sua declaração à nossa 1a.dama do agreste e de nosso Teatro.Abração.Cristina Henriques
Diva
Uma bela dama e uma bela vida. Deixa muita lembranças e realizações. Certamente deixa uma saudade que será rica e gostosa porque soube fazer bem coisas muito boas.
Um grande abraço
joe
Bela homenagem Girley !
Mauro Gomes
Justos e necessários,além de merecidos, os seus comentários sobre Diva Pacheco. Graças a ela e ao seu marido, Plinio,os grandes realizadores de Nova Jerusalem, Pernambuco ganhou relevância no cenário cultural e artístico mundial. Zezito Maciel.
Girley,
Muito bonito e comovente, sua pena é extraordinária.
Abs.
Mario Cunha
Girley Amigo
Me identifiquei muito com esse belo texto. Sei perfeitamente o que você está sentindo. Eu também tive uma tia que era uma Diva para mim. A diferença de idade (16 anos) não contava muito. Era a minha comparsa predileta. Íamos juntos às aulas de piano, cinema, festas da Padroeira e até segurava a vela nos seus namoros. Nos deixou na madrugada do dia 26 aos 92 anos bem vividos. Ainda no Natal passado ela me enviou um CD com a gravação de duas valsas que havia composto. De tudo meu amigo, restam apenas as boas lembranças. As minhas e as suas com a sua diva Diva. Que os homens lá em cima zelem por ambas. Meu abraço fraterno. Hugo
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