sexta-feira, 19 de julho de 2024

Crimes contra o Patrimônio

Entre as muitas belas lembranças que guardo das minhas andanças mundo afora, destaco de forma muito vibrante, minha admiração com os cuidados que as cultas sociedades dispensam à preservação dos seus patrimônios artísticos e históricos. Considero ser extremamente prazeroso circular em sítios onde monumentos arquitetônicos e históricos dominam o ambiente e provoca ao visitante a sensação de estar mergulhando nas origens da gente que ali vive. Gente que sabe da importância do local raiz e sente necessidade de cultuar e preservar. Já tratei deste tema aqui no Blog noutra ocasião. Recordo que enumerei locais e publiquei fotos que disponho no meu arquivo pessoal colhidas na Europa, China, Japão entre outros pontos. Não é o caso desta postagem. Hoje, volto ao tema provocado pela crescente e inominável exploração imobiliária que domina a sociedade brasileira, cujo maior objetivo parece ser apagar a história nacional quando expressa nos monumentos históricos da arte e da arquitetura. E tudo diante da miopia e impunidade do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional e seus agentes locais. Doloroso. Isto sem falar nas tribos de grafiteiros e muralistas que sem pena e sem punições enchem as cidades de poluidoras imagens em prédios públicos e privados. Pouquíssimos desses artistas muralistas se salvam e se destacam. Entre estes lembro de um Eduardo Kobra que vem marcando sucesso no Brasil e no exterior. E também dos gêmeos paulistas Gustavo e Otavio Pandolfo reconhecidos mundialmente dados seus personagens caricatos e cores vibrantes. A Prefeitura do Recife fez colocar uma bela imagem de Luís Gonzaga o Rei do Baião. Justa homenagem! Agora, essas turmas que grafitam com símbolos ilegíveis e que travam uma disputa de ocupação de espaço, nas paredes disponíveis e tantas vezes repintadas, são abomináveis. Esses dias vi um painel de Francisco Brennand, no centro do Recife, completamente pichado! Mas, vamos ao que interessa dessa vez. A inclusão deste tema na pauta do Blog foi devido ao tomar conhecimento, dias recentes, da monstruosa possibilidade da demolição da famosa Mansão Gibson, datada de 1847, em estilo neomanuelino, situada na Avenida Rui Barbosa, no Recife. Pertencente originalmente ao grande comerciante inglês Henry Gibson e no passado mais recente ao ex-banqueiro Jorge Baptista da Silva, falecido poucos anos atrás, é indiscutivelmente um dos mais belos patrimônios arquitetônicos da cidade. (Vide Foto a seguir). Ora, meu Deus, não tem crime maior do que esse contra a história recifense. Precisamos criar um movimento de defesa dessa bela construção de quase 200 anos. Pior de tudo é saber que a ideia é a de construir duas torres de apartamentos de alto luxo. É uma tragédia nacional.
A proposito desta loucura lembro-me da abertura da Avenida Paulista, nos idos dos anos 70. Nessa época, estando cursando uma pós, na USP, vi a velocidade de como as grandes mansões, antes residências dos barões do café, serem destruídas nas caladas da noite e cedendo espaço para a grande Avenida, hoje transformada na grande passarela das manifestações politicas nacionais. Dava tristeza ver desaparecer tantos palacetes pertencentes às famílias abastadas que deram combustível para o engrandecimento do “país” São Paulo. E do Brasil, por que não destacar? Não me conformo com essa cultura destruidora. Aqui no Recife, uma cidade de quase quinhentos anos, muitas das preciosidades arquitetônicas já foram abaixo. Quem não se lembra da Casa Navio? Era uma atração turística. Foram muitos os turistas que recebi e manifestavam, de pronto, o interesse de posar para uma foto à frente daquela casa icônica. O estilo podia ser discutível. Mas, que marcou uma época, isso é indiscutivel. Detonaram-na e fizeram subir um arranha-céu sem grande expressão. (Vide Foto a seguir)
Do mesmo proprietário da Casa Navio, outro belíssimo palacete, no bairro da Boa Vista, foi adquirido por uma construtora ambiciosa que o demoliu e construiu no local um grupo de prédios de baixa categoria e, também, sem qualquer expressão arquitetônica. O referido palacete, segundo membro da família da minha relação de amizade, encerrava uma vibrante história por haver pertencido ao Conde da Boa Vista e posteriormente à Condessa Pereira Carneiro, dona do Jornal do Brasil. E assim ocorreu com outros tantos palacetes recifenses. Lamentável. No mais, não custa lembramos dos roubos e mutilação de obras de arte, muitas das quais sem modos de recuperação. O Parque das Esculturas, no Marco Zero, de Francisco Brennand, foi um dos locais agredidos por furtos de peças importantes. E os painéis de Lula Cardoso Aires na antiga estação de passageiros do Aeroporto que, segundo fui informado ficaram ao abandono e ao sabor do tempo levando inclusive chuvas.(Foto a seguir)
Ah! Outra coisa que me lembro, agora, é do belíssimo painel cerâmico de Brennand, também, retratando a Batalha dos Guararapes, num prédio de grande porte, na Avenida Dantas Barreto que foi esquecido pelas administrações relapsas da cidade e terminou sendo desfalcado de incontáveis peças. Fala-se que serviu de mictório de emergência de transeuntes que nem imaginavam o crime que cometiam. Recuperado foi posto num local mais seguro, no bairro de Boa Viagem. Eita! Brasil! Nem mais bom de bola! Nota: fotos obtidas no Google Imagens.

15 comentários:

Jose Paulo Cavalcanti disse...

Belo texto como sempre, mestre. Só tenho uma dúvida. É que, pelo que disseram, a casa dos Baptista da Silva não será derrubada. Os edifícios serão construídos por trás seja. Bom conferir. Abraços.

Durvalino Andreotti disse...

Num país onde o QI médio da população é 83, não podemos esperar nada melhor do que isso

João Theobaldo de Azevedo Filho disse...

Parabéns, meu caro e prezado;Girley Brasileiro .Excelente Postagem, inclusive comentada pelo ilustre advogado Pernambucano, José Paulo Cavalcanti e Andreotti.

Gilberto Linhares disse...

Parabéns querido amigo e companheiro Girley. Como sempre em suas formidáveis crônicas, abordando, temas importantes e interessantes. Vamos torcer, que a informação do Dr José Paulo Cavalcanti seja verdade. Abraços de Gilberto e Maria.

Joao Theobaldo de Azevedo Filho disse...

Girley,lembrei ao Ler,de outra Infeliz Iniciativa; ac retirada da Ponte Giratória, um Marco do Recife e poucas no Mundo.

Clovis Cavalcanti disse...

Obrigado, Girley. O tema do post interessa. Um abraço.

Romero Marques disse...

Parabéns Girley , por esse alerta. Saudades amigo

Francisco Abreu disse...

Prezado Amigo!
Espero que essa mensagem lhe encontre com saúde e paz junto aos seus.
Passando para parabenizar pelo texto e lhe agradecer sempre pela a atenção na minha primeira viagem à Europa em 2007 entre tantas outras que fizemos juntos e principalmente minha acolhida em Lisboa tarde da noite você me pegou no hotel e me deu um passeio por Lisboa a noite me mostrando todos os detalhes dessa linda cidade e ainda tomamos um vinho num alto vendo a ponte sobre o Tejo. Minha eterna gratidão e um grande Abraço no amigo de sempre!
Quando puder marcamos um café!

zmvg disse...

Parabéns pela coragem de trazer a luz o flagelo do patrimônio histórico do Recife.
Há uns anos assuntos controversos pelos vários tipos de interesses que os envolvem e vultosos valores, que desafiam o credo de alguns viventes da cultura, desabrochou neste sórdido mar o pobre destino do Ed Haliday. Falsidades e interesses motetaculturais desabrocharam em forma de 1001, sem que fossem o famoso bom Bombril que lustra enquanto brilha, a edificação projetada pelo nacionalmente reconhecido arquiteto Acácio Gil Borsoi das décadas de 50/60, quando serviu de “garsoniere” a alta sociedade que dispunha de um monte de Cruzeiros disponíveis para lazer, lá foram (bem) investidos. Poucos anos depois com o seu regimento da indústria dos Motéis, e com a “falação” pelos movimentos adores do bairro o imponente Holiday ficou mal afamado resultando num prédio de má fama ocupado por seres desvalidos por algumas décadas em todo este tempo transparente ao poder público que somente se concretizou pela mesma turma da especulação imobiliária que hoje quer transformar a casa do Sr Jorge Batista da Silva em mais um empreendimento, daqueles que mutilam a área e coloca como gorjeta histórica o imóvel lá existente que junto a área por ele ocupada, dão contexto a História toda do local, melhor dizendo, neste caso não pode existir o mais ou menos História como convém aos interessados, ou é História ou não é História, como acreditasse ser com relação ao pavimento de uma rua, ou é de asfalto ou não é de asfalto, é uma rua com seu leito natural, barro, areia ou o que quer que seja só não é pavimentada.
Primo Girley, quem após a nossa geração sabe dizer aonde fica a casa que pertenceu a João Tenente? Ou o Castelinho? Cadê a “verdadeira” História que restou aí?
Pondo um ponto final, cadê o puteiro em que se transformou o Holiday que no final foi tocado de lá pra fora, cercado por uma porcaria de um tapume, vigiado as custas do contribuinte durante anos, tudo sob o argumento de defender a sociedade de uma possível tragédia de desabamento, está lá, de pé, sem tapume e sem vigilância pública. Vá saber porque, quem sabe por uma roptura de algum elo da corrente de interesses…

Édson Junqueira disse...

Girley meu amigo li o artigo sobre cultura e em verdade vos digo . Pra que cultuar símbolos onde impera a lei dos mais forte ? Acrescido que para os políticos . Quanto antes apagarem nossa os memoriais , mais eles ganharão o poder dos votantes burros e incultos.

Adolpho Ledebour disse...

Minha Bisavó era filha de Bento Magalhães , Evangelina Gibson Magalhães , casou-se com um alemão Hermann Adolf Ledebour e deu origem a nossa família

Nathália - Voz Comunicação disse...

Olá, Girley.
Tudo bem?

Meu nome é Nathália, sou sócia da Voz Comunicação, empresa que faz a assessora de imprensa da família Baptista da Silva.


Gostaria de esclarecer que a notícia sobre a venda e demolição do casarão é inverídico. Abaixo, envio uma nota oficial em nome da família:


NOTA OFICIAL - O propósito da família Baptista da Silva é fazer do casarão da Rui Barbosa um memorial familiar, por isso não existe no presente ou no futuro nenhuma intenção de venda do imóvel que faz parte da história urbana recifense.


Fico à disposição caso tenha qualquer dúvida.

Muito obrigada!

Clovis Cavalcanti disse...

Depois de nova leitura do blog, presto-lhe minha total solidariedade. Destruir nosso patrimônio histórico é uma barbaridade sem conta. Os exemplos que você dá correspondem ao que eu daria. O mural de Brennand na Dantas Barreto sempre me fez parar para contemplá-lo. Essa do palacete de Batista da Silva é um absurdo gigantesco. Pior é substituí-lo por espigões, essa invenção nojenta da moderna arquitetura. Graças a Deus, moro no Sítio Histórico de Olinda, longe de prédios. Vejo, à distância, as Torres Gêmeas do Cais de Santa Rita. Por escrever no Diário de Pernambuco contra essa obra, fui processado pela MD por alegado crime de "calúnia e difamação". Mas ganhei na Justiça, com a ajuda de dois bons advogados -- Carlos Gil Rodrigues e Fred Guilherme de Lima.

Ana Menezes disse...

Girley parabéns pelo artigo. A leitora que escreveu " QI médio da população é de 83 e não podemos esperar nada melhor do que isso" assinala algo bem apropriado com relação a eleição municipal. Propagam uma hegemonia política e fictícia de um candidato, aglutinando nele uma falsa liderança. A cidade continua a mesma. Imunda, sem saneamento, fedor insuportável, prédios abandonados, insegurança, alagamentos, deslizamento de morros, hospitais sucateados, desabrigados morrendo nas ruas e tantas outras mazelas. Qualquer nova licitação vem sempre anexada à nota "amanhã". Nunca se viu uma gestão tão enganadora e medíocre como esta que estamos vivendo.

Dulce Nadruz disse...

Parabéns amigo! Excelente comentário .

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